Título: Mudança de cara e de tática
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 02/07/2005, O Globo, p. 2

O grau de preocupação do presidente Lula com a crise política aumentou sensivelmente a partir da quinta-feira gorda de Roberto Jefferson, precedida de uma noite das tormentas na Câmara. Isso é bom, desde que se traduza em iniciativas, como o anúncio da reforma ministerial na segunda-feira. Já o PT, como fez Delúbio Soares ontem, segue na defensiva usando o biombo do golpismo.

No início da noite de quinta-feira, o ministro Antonio Palocci e o presidente conversaram sobre a necessidade de acelerar a reforma, adequando o rosto do governo à nova situação política e estabelecendo logo um novo esquema de coordenação política para enfrentar a crise e evitar erros na hora crucial.

A reforma que já estava em curso tinha duas premissas. Uma, a permanência dos chamados ¿intocáveis¿: Palocci, Márcio Thomaz Bastos, o chanceler Celso Amorim, Furlan e Roberto Rodrigues. Outra, a saída dos que serão candidatos a cargos eletivos em 2006, evitando-se nova reforma em abril.

Mas de quinta para ontem, Lula acelerou as providências. A alguns ministros políticos pediu que não disputem eleições ano que vem ficando no governo até o fim. Um deles, apesar de Roberto Jefferson, é o petebista Walfrido Mares Guia, do Turismo, que pretendia disputar novo mandato de deputado. Aceitou o apelo. Outro, Eduardo Campos, da Ciência e Tecnologia, que ainda hesita. Gostaria de ficar até abril e pode ser que Lula lhe abra uma exceção. Ciro Gomes também fica, ainda que possa vir a ser candidato no Rio. Aldo Rebelo ficará, mas em outra pasta.

O PT deve perder Ricardo Berzoini (que volta à Câmara), Olívio Dutra (para ceder Cidades ao PMDB) e Humberto Costa (Saúde), que será candidato a governador de Pernambuco. E ainda os ministros-secretários Nilmário Miranda, dos Direitos Humanos, que será candidato a presidente do PT de Minas e a deputado federal José Fritsch, com a anexação da área de Pesca à pasta da Agricultura.

A escolha dos ministros peemedebistas está adiantada mas ainda pode sofrer alterações até segunda-feira, quando Lula voltará a se reunir com os senadores Renan Calheiros e José Sarney. Romero Jucá (Previdência) e Eunício Oliveira (Comunicações) saem. Silas Rondeau é nome certo para Minas e Energia, por indicação de Sarney e com o apoio da ministra Dilma. Já o senador Helio Costa, que representaria a bancada do Senado, refugou a pasta da Previdência argumentando que a seu ver ela deve ser ocupada por um técnico, descomprometido com o dia-a-dia da política e dedicado inteiramente, e a longo prazo, à superação da crise no setor. Deve ser deslocado para Comunicações, área com que tem verdadeira afinidade. Mas, neste caso, dificilmente o médico e deputado Saraiva Felipe, mineiro como ele, será ministro da Saúde, como se tem dito. O mais provável é que o PMDB aproveite a oportunidade para resolver velha disputa entre Felipe e José Borba pela liderança da bancada. Borba, que é do Paraná, seria ministro, provavelmente de Cidades, e o outro se tornaria líder. Paulo Lustosa, indicado inicialmente para Comunicações, iria para a Previdência.

Procura-se ainda um bom nome do PP para um ministério. Devem sair ainda os presidentes da Petrobras, de Itaipu e da Infraero, e outros que sejam candidatos.

A coordenação política seria exercida em três frentes. Palocci negociaria o teor dos projetos, Paulo Bernardo (outro que fica), do Planejamento, a liberação de emendas e Jaques Wagner faria a interface Palácio-Congresso. A questão das CPIs seria conduzida pelos líderes no Congresso. Na concepção de Wagner, o governo deve ficar longe disso, fazendo a sua parte através das investigações da CGU e da Polícia Federal. Com a coalizão refeita, o governo tentaria retomar sua própria agenda enquanto a carruagem de fogo das CPIs seguiria, queimando quem tiver de ser queimado. Se for para valer, tática diversa e mais sensata que a do PT parlamentar, de resistir às investigações, tentando dirigir as CPIs ou até mesmo barrar providências inevitáveis, como a quebra de sigilo do publicitário Marcos Valério.