Título: Jornalista encarcerada nos EUA
Autor: José Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 07/07/2005, O Mundo, p. 31

Tribunal manda prender repórter do `New York Times¿ que se recusou a revelar fonte

Aliberdade de imprensa nos Estados Unidos, exaltada orgulhosamente há séculos pelos americanos, sofreu um duro golpe ontem: um juiz federal, em Washington, mandou uma repórter para a cadeia pelo fato de ela manter uma promessa feita a uma fonte de informação. Judith Miller, do jornal ¿The New York Times¿, insistiu em não revelar à Justiça o nome de uma pessoa que lhe passara uma informação confidencial, num caso que envolve a identificação de uma espiã da CIA, a Agência Central de Inteligência, feita por altos funcionários do atual governo. Por isso ela ficará atrás das grades até o próximo dia 28 de outubro.

¿ A senhora tem em suas mãos as chaves de sua própria cela ¿ disse-lhe o juiz, ressaltando que a prisão não seria uma punição e sim uma forma de tentar coagi-la a mudar de idéia.

No dia em que decidir acatar a determinação judicial, antes de 28 de outubro, a repórter será libertada. Ela, no entanto, garantiu que continuará honrando o seu compromisso com a sua fonte. Assim que o juiz Thomas Hogan lembrou à jornalista, ontem à tarde, que aquela era a última chance que ela tinha para entregar a sua fonte sigilosa, Miller, visivelmente nervosa, levantou-se e, lendo uma nota que escrevera, disse:

¿ Se jornalistas não podem ser confiáveis para garantir confidencialidade, então os jornalistas não podem funcionar como devem e não poderá haver imprensa livre. O direito da desobediência civil está baseado na consciência pessoal, é fundamental ao nosso sistema e tem sido honrado através de nossa História.

Cooper, da `Time¿, voltou atrás e depôs

Matthew Cooper, da revista ¿Time¿, que também vinha sendo pressionado a testemunhar há dois anos ¿ igualmente para entregar uma fonte de informação ¿ capitulou em cima da hora. Tenso, claramente constrangido, Cooper explicaria que tomara tal decisão unicamente por ter sido liberado, à última hora, pela sua própria fonte. Dias atrás a própria revista ¿Time¿ já havia recuado, entregando à Justiça as anotações das entrevistas feitas por Cooper e também mensagens de e-mail em que ele mencionava, a seus editores, a sua fonte sigilosa. Bill Keller, editor-chefe do ¿New York Times¿, lamentou:

¿ A decisão de mandar Judith Miller à prisão é assustadora porque ela facilitará futuros encobrimentos da verdade envolvendo informações governamentais ¿ disse ele.

Mais tarde, o presidente da New York Times Company, Arthur Sulzberger Jr., emitiu um curto comunicado: ¿Há épocas quando o bem maior da nossa democracia exige um ato de consciência. Judy escolheu esse ato ao honrar a sua promessa de confidencialidade às suas fontes. Ela acredita, como nós, que o fluxo livre de informação é crucial para uma cidadania informada¿.

O promotor Fitzgerald foi encarregado pelo governo de descobrir quem revelara ao colunista Robert Novak, do ¿Chicago Sun-Times¿, que Valerie Plame era espiã da CIA há 20 anos. O jornalista publicou essa informação atribuindo-a a dois altos funcionários do governo. Cooper, da ¿Time¿, entrou no assunto depois da publicação da coluna de Novak. Miller, do ¿Times¿, fez entrevistas mas não chegou a publicar nada.

O estranho é que Novak, que se mantém em silêncio, aparentemente não foi intimado a depor. Se fez isso em sigilo e revelou as fontes, o caso já estaria solucionado ¿ sem necessidade de Cooper e Miller deporem. Se Novak nada disse, teoricamente teria de sofrer a mesma pressão que os outros dois sofreram.

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