Título: Tantas perguntas, tanta perplexidade
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 06/07/2005, O Globo, p. 2

As revelações explodem e se acumulam com uma velocidade espantosa, aumentando a perplexidade geral ante tantas coisas que se explicam, peças que se encaixam e outras que continuam exigindo respostas. Por que, afinal, precisava o PT de tanto dinheiro, ao ponto de ter se endividado em mais de R$20 milhões junto a três bancos? E por que se endividar se tinha um provedor, Marcos Valério, que era abastecido pelo dinheiro público que jorrava dos contratos com órgãos federais?

Os depoimentos de ontem na CPI só fizeram aumentar as indagações. O empresário Wascheck afirmou na semana passada ter mandado gravar Maurício Marinho em ato explícito de corrupção, declarando-se membro de um esquema do PTB e de Roberto Jefferson, apenas para remover quem dificultava seus negócios. Jairo Martins, ex-araponga que fez o serviço, afirmou ontem que desde o início o objetivo foi divulgar a fita, coisa que ele providenciou junto à revista "Veja". Mais ainda: conheceu Wascheck por meio de um parente de Carlinhos Cachoeira, aquele que gravou Waldomiro Diniz. Vamos ver se Valério, hoje, tornará a paisagem mais clara ou mais confusa.

"O mensalão é um crime hediondo na política", diz corretamente o deputado Chico Alencar, da revoltada esquerda petista. O mensalão amargura corações e mentes, precisa ser cabalmente esclarecido, pagantes e recebedores punidos. Mas é preciso responder às perguntas laterais. Explicar esta voracidade por dinheiro, que levou o PT a contrair outros dois empréstimos, além do que foi avalizado por Valério junto ao BMG. Tudo isso o PT precisa explicar, inclusive para tentar se salvar e recomeçar. Seus militantes são os mais perplexos. Nunca imaginaram ver o partido que tinha a ética no altar principal no duplo papel de corrupto e corruptor. Os desabafos estão aí, na internet, nas cartas de leitores, nos blogs, nas ruas. Há os deprimidos, os revoltados e os paralisados pelo espanto. Realizado o esforço para que Delúbio Soares deixasse a executiva do partido, José Genoino ficará na presidência pelo menos até sábado, quando será eleita uma direção provisória. Há um outro esforço, no Campo Majoritário, para fazer prevalecer a idéia de que Genoino, logo depois de sua posse como presidente do partido, não sabia o que fazia em fevereiro de 2003, ao assinar o contrato com o BMG, que Delúbio lhe apresentou sem esclarecer quem era o avalista. No programa Roda Viva de anteontem, Genoino fez claro esforço para sustentar esta versão, a de que assinou "em confiança ao Delúbio", sem entretanto acusá-lo de traição.

Não se entende por que o PT, durante tanto tempo e até à última hora, tentou proteger Delúbio, como ainda fez Genoino. Como não se percebeu o mal que seu tesoureiro espalhava, apesar de tantos avisos? Houve a suspeita de que comprou terras que seus recursos não permitiriam, houve o escândalo do show patrocinado pelo Banco do Brasil, houve o festival de shows milionários na campanha eleitoral e, sobretudo, aquela frase mortal do senador Tasso Jereissati, na discussão das PPPs:

- Deste jeito é para o Delúbio deitar e rolar!

Ficaram ofendidos os petistas, quando deveriam ter procurado saber o que seria "deitar e rolar".

"Só o PT salva o PT", diziam ontem os 13 deputados da esquerda petista, agora confortáveis na posição de quem discordou das alianças e dos rumos tomados. Mas o que eles propõem também não salva o PT. Por exemplo, a não realização de aliança com o PMDB, quando sabem que Lula não governará apenas com os 17% de cadeiras do PT - sem falar que eles mesmos nem sempre votam com o governo.

Salvar o PT é um problema dos petistas. Mas salvar a crença na democracia representativa é um problema de todos. Isso, só com respostas a tantas perguntas, a tanta perplexidade.