Título: Pela ordem
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 08/07/2005, O Globo, p. 2

Na CPI que investiga corrupção nos Correios e vastas adjacências um documento do Coaf foi roubado na noite de terça-feira, antes de ser distribuído aos pares para exame. Membros da CPI foram intimidados pelo deputado Roberto Jefferson em seu depoimento, e nem por isso deixaram de se congratular com ele no final. A ordem dos trabalhos é freqüentemente quebrada por gritos de guerra entre governistas e oposicionistas, sem falar na luta de egos. Definitivamente, o funcionamento da CPI não vem atendendo à gravidade da situação.

Sessão de CPI não é para confraternizações e delicadezas, seus membros devem atuar com independência e firmeza. Interesses políticos sempre estarão presentes mas não podem romper os limites do regimento e sobretudo da busca da eficiência na investigação. Num tempo em que os depoimentos são transmitidos ao vivo pelo rádio e pela televisão, o tumulto prejudica esta forma nova de exercício do direito à informação. Há momentos em que o depoente nem entende o que lhe está sendo perguntado.

O documento do Coaf era importante para a inquirição do publicitário Marcos Valério. Continha informações importantes sobre os volumes financeiros que passaram por suas contas, havendo depósitos não identificados, a partir de 1999, da ordem de R$500 milhões. Não foi distribuído porque chegou na noite da véspera mas foi roubado e distribuído a alguns parlamentares. O presidente da CPI, Delcídio Amaral, admitiu o roubo e prometeu controlar criteriosamente o acesso aos documentos. A CPI do Banestado se perdeu quando os documentos tornaram-se munição numa luta política PT-PSDB.

A relação com Roberto Jefferson é um caso à parte. Alguma informalidade pode mesmo acontecer entre colegas de Parlamento mas não excesso de liberalidade. Na noite de terça-feira, em entrevista a Jô Soares, ele admitiu ter reconhecido entre os membros da CPI parlamentares que receberiam mensalão. Todos reagiram e a senadora petista Ideli Salvatti exigiu que ele apontasse os nomes. Pode ser que ele tenha mesmo entendido que Jô se referia ao Conselho de Ética, como explicou ontem em nota à CPI, que foi lida por Delcídio. No último parágrafo, Jefferson atacou a senadora Ideli, acusando-a de integrar a executiva do PT, que, segundo ele, comanda o pagamento de mensalão. Ou seja, acusou a senadora de cúmplice do crime que denunciou. No depoimento da semana passada já afirmara, sem ser contestado, que todos ali adulteram suas prestações de contas eleitorais ao TSE.

Os momentos de briga de garotos em pátio de colégio continuam se repetindo, como ontem, numa discussão de quatro horas sobre a quebra de sigilos bancários de Jefferson e da cúpula do PT. No final, Dirceu, Delúbio, Genoino e Silvio Pereira mandaram ofícios colocando os sigilos à disposição da CPI, evitando que a oposição faturasse o feito como vitória e livrando os governistas daquele constrangimento desnecessário. Mas perdeu-se tempo demais com o inevitável. Nestas bases, a CPI não chega a bom destino, que é a obtenção de provas e esclarecimentos, quando mais cedo melhor.

A bananeira da economia

A crise obscureceu a importância do jantar de terça-feira, organizada pelo deputado Delfim Netto, reunindo empresários importantes, ministros e políticos para discutir a proposta de déficit nominal zero. Ainda que não haja consenso sobre esta proposta - que permitiria a redução dos juros e o impulso ao crescimento - o que o encontro revelou foi uma insurgência do empresariado contra a política econômica, definida por Delfim como "bananeira que já deu cacho". O ministro Palocci mostrou-se aberto embora o PT reaja, alegando que as políticas sociais seriam atingidas, hipótese que o ministro Paulo Bernardo descarta. Mas atolado na crise, o PT nem tem energia para este debate. O Ipea responde com uma proposta intermediária que será divulgada hoje: ainda este ano haveria um aumento do superávit primário para 5% do PIB, que valeria também para o ano que vem. Estas medidas, diz o documento do Ipea, seriam elemento de uma estratégia para a redução dos juros em 2006 e a eliminação do déficit nominal em três anos.

Intenções explícitas

Os jornais da época da CPI do PC mostram que a palavra impeachment só começou a ser pronunciada ali quando a situação de Collor tornou-se insustentável. Agora, vemos os governistas tratando de esconjurá-la, com garantias de que o presidente está blindado, foi traído etc., e os pefelistas usando argumentos de absoluta explicitude eleitoral .

- O PFL não pretende de forma nenhuma propor o impeachment. Queremos que o governo enfraqueça, até que apodreça - disse o senador Agripino Maia.

E Jorge Bornhausen, presidente do partido:

- Queremos o julgamento do presidente Lula nas urnas. Ele deve ser condenado a ser candidato à reeleição para que seja julgado pela sua incompetência.

Mas a lei é clara e não observa interesses eleitorais de A ou B. Se há crime eleitoral, o presidente deve ser julgado segundo o rito da Lei 1.079.

OS MINISTROS do PMDB tomam posse hoje mas para o Ministério das Cidades Lula continua querendo um nome reluzente da sociedade civil. Por exemplo, o presidente da Firjan, Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira. De quebra, daria uma pancada em Garotinho, que voltou à guerra interna no PMDB, contra os que aceitaram ser ministros.

LULA chegou a conversar com o deputado Delfim Netto sobre sua ida para o Ministério. Não conseguiu porém tirar do PMDB a pasta de Comunicações que lhe fora prometida. O empresariado lamentou muito.