Título: VANTAGENS DO VOTO DISTRITAL
Autor: TITO RYFF
Fonte: O Globo, 08/07/2005, Opinião, p. 7

Há muito tempo sabe-se que o sistema político-eleitoral brasileiro leva, inexoravelmente, à degradação da representação parlamentar. O voto plural nas eleições legislativas dilui o vínculo entre eleito e eleitor, dilacera os partidos, favorece o abuso do poder econômico e distorce a escolha do eleitorado. A possibilidade de coligações partidárias nas eleições legislativas só faz agravar o quadro: vota-se no partido X e contribui-se para a eleição de candidatos do partido Y.

Busca-se, agora, em meio à grave crise política que assola o país, solução para o problema. Cogita-se da adoção da lista partidária. Entre os argumentos favoráveis ao voto de lista ressaltam a redução da influência do poder econômico, a diminuição do número de candidatos e a sua melhor adequação ao instituto da fidelidade partidária e ao financiamento público de campanhas. Como argumentos contrários, merecem destaque o fortalecimento dos "caciques" políticos e a perda de soberania do eleitor, impedido de votar no candidato de sua preferência. Esta última alegação é particularmente grave em razão das características socioculturais do eleitor brasileiro e da pouca importância que ele confere aos partidos políticos. Tudo indica que trocaríamos um sistema cujos males são sobejamente conhecidos por outro cujos males são perfeitamente previsíveis.

Por que não considerarmos, então, a adoção do voto distrital? As vantagens são inúmeras. O vínculo entre eleito e eleitor seria forte e direto. Dificilmente alguém poderia afirmar que esqueceu em quem votou nas últimas eleições legislativas. O número de candidatos cairia verticalmente, tornando as campanhas mais baratas, caso fossem financiadas com recursos públicos, como se deseja. A influência do poder econômico passaria a ser contrabalançada pelo contato mais direto entre eleitor e candidatos, e os possíveis abusos seriam mais fáceis de detectar. Os partidos políticos acabariam fortalecidos e teriam grande responsabilidade na escolha de seu candidato em cada um dos distritos. Qualquer escolha malfeita representaria um ônus político direto e inquestionável para o partido.

O voto distrital em dois turnos facilitaria a constituição de maiorias parlamentares baseadas na afinidade ideológica ou de propósitos e não na troca de favores, como ocorre atualmente. Por fim, a sua adoção criaria a possibilidade da introdução, no Brasil, do recall. Trata-se de um mecanismo que existe em alguns estados americanos que permite a convocação de novas eleições, para a destituição de um membro do Legislativo, mediante a subscrição de uma petição por um determinado percentual de eleitores do distrito. Ou seja, os eleitos ficariam submetidos não só ao escrutínio permanente de seus eleitores, mas, também, eventualmente, à sanção de perda do mandato determinada pelo voto popular. Santo remédio para alguns dos nossos males!

O voto distrital tem somente vantagens? Possivelmente não. Os críticos dizem que sua implantação tornaria as eleições fortemente paroquiais. No início, é possível que sim. Mas confio em que o eleitor brasileiro saberia (se é que ainda não sabe) distinguir, em pouco tempo, a diferença entre eleições municipais, estaduais e nacionais. Os bons partidos certamente saberiam, e isso se refletiria na escolha de seus candidatos. Os adversários da idéia acrescentam que o voto distrital esmaga os pequenos partidos e desemboca, inevitavelmente, no bipartidarismo. Não necessariamente. E menos ainda num país com as dimensões continentais do Brasil e com a sua enorme diversidade sociocultural que se reflete nos costumes políticos.

Seja como for, a implantação do voto de lista não parece solução adequada para a crise política do país. Por outro lado, as inúmeras vantagens do voto distrital não podem ser ignoradas. Por que não, num período de transição suficientemente longo para a avaliação do sistema, a adoção de um sistema misto com voto de lista e voto distrital? Deixar tudo como está é que parece impossível. O país já pagou um preço alto demais pelos vícios e defeitos de seu sistema político-eleitoral.

TITO RYFF é secretário de Estado de Planejamento.

O voto distrital pode não ter só vantagens, mas é muito superior ao sistema atual