Título: Alta velocidade
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 09/07/2005, O Globo, p. 2

Uma das coisas mais espantosas da crise política em curso é sua velocidade, a rapidez com que as denúncias surgem e, por outro lado, a lentidão com que reagem o PT e o governo. Outra diferença parece estar na inutilidade de algumas respostas. Cabeças rolam mas em questão de horas tudo perde o sentido porque fatos mais graves aparecem. Hoje, a tentativa será do PT.

A ser verdade que uma "oligarquia partidária", como diz o deputado Paulo Delgado, cometeu sozinha os desatinos que atingem violentamente o governo do presidente Lula e o próprio partido, o susto e a depressão de outros dirigentes explicariam a catatonia. Mas a hora do choque já passou, e o que se exige agora é uma atitude à altura da situação.

A reunião do diretório nacional que acontece hoje em São Paulo parecia preparada para garantir a permanência de José Genoino na presidência do partido, precedida de uma espécie de admissão dos erros e a indicação dos responsáveis, que nesta altura continuam sendo o ex-tesoureiro Delúbio Soares e secundariamente o ex-secretário geral Sílvio Pereira. Mas o plano parece ter ruído ontem com a prisão de um assessor do irmão de Genoino, deputado estadual e dirigente partidário no Ceará, carregando dólares e reais em uma pasta e até na cueca, um fato realmente espantoso nesta altura.

Teria sido também em favor da permanência de Genoino, e não apenas da manutenção de Gushiken no ministério, a declaração do presidente ontem, de que não aceita a decretação da pena de morte política. Mas seja qual for o destino de Genoino, o partido hoje está desafiado a dizer algo consistente à sociedade. Alguns petistas graduados - destes que se declaram sob a vertigem de revelações que nunca imaginaram, como a das relações financeiras com Marcos Valério, supostamente para a montagem de um caixa dois de campanha e para o suborno de deputados aliados - diziam ontem que só existe salvação para o partido se o governo Lula for salvo, e que, para isso, é preciso compreender a necessidade de separação entre governo e o partido. Para isso, seria necessário que o diretório cobrasse hoje o levantamento de todas as irregularidades que ainda não tenham sido reveladas e a completa exposição de todas elas num comunicado. Alguma coisa como um auto de culpa em praça pública. Antecipando-se a novas revelações, o PT e o governo sairiam pelo menos do estado defensivo, do pavor de que nova bomba estoure dentro de 15 minutos. Tendo Marcos Valério assegurando que não avalizara outro empréstimo bancário para o PT, em poucas horas foi desmentido pela revelação de que houve outro, de R$3 milhões, junto ao Banco Rural. E por que o PT não se antecipou, admitindo logo a existência desta outra operação? A pergunta era feita por petistas mas a pergunta teria que ser feita à direção, que nesta altura já não existe.

Recompor a direção é o que petistas buscarão hoje na reunião do diretório nacional mas a hora exige mais que isso. Exige mesmo que se abra a caixa dos segredos que ainda restem, antes que venham logo a público, seguindo a velocidade com que as coisas estão acontecendo. Mas é previsível que se dediquem mais à disputa interna do que a dar satisfações públicas sobre este enredo que parece misturar corrupção de parlamentares, apropriação de recursos públicos, lavagem de dinheiro e outras coisas feias praticadas pelo partido que mais pregou a ética na política nos últimos 25 anos.