Título: Dólar derruba até inflação
Autor: Cássia Almeida
Fonte: O Globo, 09/07/2005, Economia, p. 23

IPCA registra queda de 0,02% nos preços em junho, pela 1ª vez em dois anos

Pela primeira vez em dois anos, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrou deflação. A taxa de -0,02% em junho refletiu a desvalorização do dólar, que já chega a 10,5% no ano, e é a menor desde junho de 2003, quando o índice que orienta o sistema de metas de inflação chegou a -0,15%, divulgou ontem o IBGE. Em maio, o índice ficara em 0,49%. Antes disso, a última vez que o indicador ficou negativo foi em novembro de 1998, quando vigorava o sistema de câmbio controlado. No ano, a taxa subiu 3,16%, e já atingiu 61% da meta para o ano, de 5,1%. Em 12 meses, 7,27%:

- O câmbio apreciado permeou o índice como um todo. Mas contribuíram para o resultado a queda dos preços de combustíveis e a safra agrícola. Houve queda ou redução do ritmo do reajuste de forma generalizada no mês passado - explicou Eulina Nunes, gerente do Sistema de Índices de Preços do IBGE.

O dólar foi o principal impulso para trazer a inflação a níveis recordes. Houve queda nos preços dos alimentos, em média 0,67% mais baratos. No setor de higiene e limpeza, outra baixa: 0,63%. Mas a contribuição individual mais importante veio do álcool combustível cujo preço caiu 8,79% em junho e 15,10%, no ano:

- Em 2004, o preço subiu 31,58%, depois de recuo grande em 2003. Agora, voltou a cair.

Assim como o resultado cheio, os núcleos de inflação (medidas que retiram do índice as oscilações mais fortes) vieram bem mais baixos. A média caiu de 0,56% para 0,37% de maio para junho. O índice de difusão, que capta a parcela dos itens do IPCA com aumento de preço passou de 65,8% para 61,7%.

- São sinais relevantes, que mostram uma inflação sob controle. O impacto do dólar depreciado nos preços dos itens industriais no atacado começam a chegar com força no varejo - disse Alexandre Sant'Anna, economista da gestora de recursos Arx Capital.

Em julho, inflação ainda comportada

No ano, a pressão maior veio das tarifas públicas. Os reajustes nos ônibus urbanos, represados em 2004 por causa das eleições, proliferaram no primeiro semestre. Das dez principais contribuições, seis são preços controlados pelo governo. Juntos, a alta de energia elétrica (5,65% no ano), remédios (5,02%), plano de saúde (5,65%), água e esgoto (7,44%) e ônibus intermunicipal (9,15%) e urbano (8,10%), representou 38% do IPCA de 3,16% no ano.

- O índice foi pressionado principalmente pelos preços administrados, mesmo com queda de 15,10% no preço do álcool e de 1,75% no da gasolina. Os alimentos também ajudaram a manter a inflação baixa - disse Eulina.

Mesmo com esse resultado abaixo do esperado, economistas não acreditam que o Comitê de Política Monetária (Copom) antecipe o movimento de queda da taxa básica de juros, a Selic, hoje em 19,75% ao ano. Como a produção industrial mostrou fôlego, com uma elevação de 1,3% em maio, bem acima das expectativas, a queda deve ficar para setembro:

- O resultado da produção industrial deixou o Banco Central mais confortável para administrar queda mais gradual dos juros, que só devem começar a cair em setembro.

Mesma opinião tem Marco Antônio Franklin, sócio da Plenus Gestão de Recursos. As medidas de núcleo são o motivo para o economista não acreditar em juros menores em agosto. A média de 0,37% ainda é alta na opinião de Franklin, o que levaria o BC a ser mais cauteloso e manter a taxa estável em julho e agosto. Se depender só da inflação, o índice de julho pode contribuir para ter juros mais baixos. O mês marcado por reajustes de tarifas - de telefonia e de energia elétrica em São Paulo - pode registrar o mais baixo número já captado para um mês de julho em toda a história recente da inflação brasileira, segundo o professor da PUC, Luiz Roberto Cunha. As previsões estão entre 0,20% e 0,40%.

Apesar do reajuste já acertado de 7,27% na telefonia, a Eletropaulo anunciou que as contas de luz devem ficar entre 2% ou 3% mais baratas este mês. A isenção de PIS/Cofins em remédios deve aparecer com mais força este mês. Os preços de alimentos, por coletas já feitas, devem se manter estáveis ou em baixa.

A ÂNCORA CAMBIAL ESTÁ DE VOLTA?, na página 24

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