Título: Alimento para o preço alto
Autor: Fabiana Ribeiro
Fonte: O Globo, 10/07/2005, Economia, p. 27

Peso de impostos no setor alimentício do Brasil é maior que em países ricos e emergentes

e, com menos imposto, poderíamos comprar mais com o mesmo dinheiro¿

OBrasil é o país que mais cobra impostos no setor de alimentos num ranking de 15 países ricos e emergentes. A média da carga tributária nacional embutida nos preços atinge 18,35% ¿ se considerados ICMS, PIS e Cofins, que correspondem a quase 70% do peso dos tributos. Uma notícia ruim, já que, segundo especialistas, os impostos elevam os preços dos alimentos, afetando diretamente o bolso das famílias brasileiras. Na vizinha Argentina, essa taxa é alta, mas é menor, de 17,44%. Na comparação com os Estados Unidos (EUA), a situação piora: a carga brasileira é quase o dobro da americana (9,75%). E na Colômbia, é ainda mais baixa: 7,91%. As conclusões são de pesquisa do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), feita a pedido do GLOBO, que analisou a incidência de impostos em 18 produtos.

¿ O Brasil se destaca porque, em geral, os países têm apenas um tributo. Aqui há uma quantidade enorme de impostos, que pesam muito no valor do alimento. É difícil encontrar um sistema tão complexo quanto o nosso. E, com isso, quem paga a conta é o consumidor. Em especial, o mais pobre ¿ disse o tributarista Gilberto Amaral, presidente do IBPT.

Pelas contas do instituto, se considerados todos os tributos do setor, incluindo Imposto de Renda, contribuição social, IPI, INSS e CPMF, a carga tributária do Brasil é ainda mais pesada, chegando a 26,52%. Perde apenas para a da Suécia (27,14%) ¿ que tem três vezes e meia a renda per capita brasileira. Mas fica bem na frente de EUA (14,20%), Venezuela (10,38%) e Colômbia (10,17%).

¿ Um país com tantas pessoas pobres não poderia ter uma tributação tão pesada assim ¿ ressaltou o tributarista do IBPT.

Carga alta atinge mais os pobres

Amaral faz questão de frisar que a política tributária brasileira sobre os alimentos pesa ainda mais no orçamentos das pessoas de baixa renda. Isso porque ricos e pobres pagam o mesmo imposto para se alimentar. Exemplo: a carga sobre o macarrão, de 35,20%, em média, é a mesma para todos os brasileiros.

¿ Um erro. O impacto do imposto sobre quem tem menos renda é enorme, o que diminui naturalmente seu poder de compra. Isso é retrato da nossa política tributária, que penaliza o consumo e não acompanha o aumento de renda. Prova disso é que Imposto de Renda arrecada menos do que todos os tributos.

Os alimentos correspondem a um terço dos gastos das pessoas de baixa renda, disse Fernando Gaiger, especialista do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea).

¿ Isenção de imposto não pode ser privilégio de quem quer comprar carro importado. Alimento, assim como remédio, é necessidade básica. Por isso, a atual carga é um estímulo à desigualdade social.

Segundo Gaiger, a tributação de alimentos enfrenta outra distorção. É que os estados pobres do país são aqueles que mais cobram impostos:

¿ Brasília, por exemplo, tem política de isenção de impostos para produtos da cesta de alimentos e medicamentos. Mas o Rio Grande do Norte não abre mão de sua arrecadação. É que o estado precisa mais de arrecadação do que de consumo.

Os supermercados também criticam o peso dos tributos sobre os produtos alimentícios. Segundo Arthur Sendas Filho, membro do conselho de administração das Sendas, os consumidores encontrariam preços mais em conta, caso a tributação fosse menor.

¿ O Brasil não poderia se dar ao luxo de tributar alimentos. Até porquê, para a população de renda baixa, a principal despesa é o alimento.

Para José Cezar Castanhar, professor da Ebape/FGV, a tributação sobre os alimentos também é um equívoco. Essa taxação alta torna o alimento mais caro, não estimula o consumo e não valoriza uma política de alimentação saudável:

¿ Diante de tantos impostos, os mais pobres ficam sem condições de melhorar seu consumo de nutrientes e o país não consegue otimizar seu mercado interno.

Castanhar acrescenta que os consumidores desconhecem o quanto os impostos pesam nas compras:

¿ As pessoas nem sabem o que estão pagando.

A corretora de planos de saúde Miriam Figueiredo, de 55 anos, e sua irmã Conceição, de 53, gastam cerca de R$600 no supermercado todo o mês. Assim como boa parte dos brasileiros, desconhecem o tamanho da mordida dos impostos nas compras.

¿ Sabemos que os impostos pesam, mas não sabemos o quanto. Talvez os supermercados pudessem informar isso com o preço. Estou certa de que, com menos imposto, poderíamos comprar mais com o mesmo dinheiro ¿ diz Miriam.

Procurada, a Receita Federal não quis comentar o estudo do IBPT.

IMPOSTO ZERO SOBRE OS ALIMENTOS REDUZIRIA A INDIGÊNCIA EM 24%, na página 28