Título: RECURSOS PREVISTOS PARA PROJETOS SOCIAIS DOS GOVERNOS NÃO SAEM DO ORÇAMENTO
Autor: Ruben Berta
Fonte: O Globo, 10/07/2005, O Globo/Caderno Especial, p. 1

O governo estadual e a prefeitura do Rio reconhecem a gravidade do problema dos menores de rua, mas não gastam os recursos que planejam em seus orçamentos nos programas voltados para crianças e adolescentes carentes e suas famílias. Levantamentos feitos nos sistemas de acompanhamento de gastos públicos da Assembléia Legislativa e da Câmara de Vereadores mostram que metade da verba prevista para 2004 e 2003 não foi usada. Somados, estado e município aplicaram R$48,6 milhões ano passado nesses projetos sociais e R$22,8 milhões em 2003. No entanto, foram autorizados investimentos bem superiores: R$102,6 milhões em 2004 e R$48,3 milhões no ano anterior.

A diferença nas contas do estado é maior. Consulta feita pelo gabinete do deputado Carlos Minc (PT) no Sistema de Acompanhamento Financeiro do Estado (Siafen) mostra que o governo investiu R$5,1 milhões, no ano passado, e R$3,9 milhões, em 2003, em rubricas como o acolhimento da população de rua, o combate à violência, o abuso e a exploração sexual de menores e no Fundo para a Infância e a Adolescência. Os gastos representam 6% do que foi aplicado em publicidade nesses dois anos: cerca de R$144 milhões.

¿ O grande problema hoje é a violência. Mesmo assim o estado destina uma miséria para a população de rua e ainda aplica só uma parte. Dos recursos autorizados para programas sociais voltados para pessoas carentes, só foram usados 30% em 2003 e 60% em 2004 ¿ comenta Minc.

O secretário estadual da Infância e da Juventude, Altineu Cortes, argumenta que só com o recolhimento de pessoas que vivem nas ruas o governo tem uma despesa de R$120 mil por mês. Outros R$576 mil mensais são gastos com os 2.300 menores infratores que estão nas unidades do Departamento Geral de Ações Socio-Educativas (Degase):

¿ São 11 unidades que, inclusive, passam por reformas. O estado está fazendo sua parte. Só em 2004, recolhemos seis mil adolescentes, 60% a mais do que no ano anterior ¿ diz Cortes.

A prefeitura não conseguiu tirar do papel em 2003 e em 2004 o programa Rio Criança Maravilhosa, para o qual tinha verba orçamentária, parte oriunda de financiamento do Banco Mundial (Bird). O motivo, diz o vereador Edson Santos (PT), é o alto endividamento do município, que não permite contratar novos financiamentos. A prefeitura discorda do parâmetro utilizado pelo governo federal para avaliar sua capacidade de endividamento. A controvérsia, dizem as autoridades municipais, tem feito com que pedidos de financiamento sejam suspensos, já que precisam de aprovação do Senado e aval federal.

Dados do Sistema Financeiro Contábil (Fincon) obtidos pelo gabinete do vereador Edson Santos mostram que, em 2004, a prefeitura investiu apenas um quinto da dotação orçamentária prevista para projetos executados pela Secretaria de Assistência Social em assentamentos populares: dos R$58,5 milhões autorizados, R$11,2 milhões foram usados. Em 2003, nem um centavo dos R$ 2,5 milhões disponíveis nessa rubrica foram aplicados.

¿ A prefeitura não conseguiu gastar tudo o que estava disponível. Não teve condição nem competência para agilizar os procedimentos. Permanece o desafio do município de transformar em prioridade os programas destinados às pessoas em situação mais vulnerável ¿ diz Edson Santos.

A Secretaria municipal de Assistência Social alega que dispõe de R$19 milhões para atender 7.137 crianças e adolescentes em seus abrigos e projetos. Para o secretário Marcelo Garcia, a verba poderia ser ainda maior:

¿ O governo federal só repassa R$35 por criança desde 1993. Considerando que temos um gasto mínimo mensal de R$640 por cada abrigado, a verba só permitiria sustentar 29 dos 648 que estão nos abrigos. Já o estado nada repassa, apesar de isso estar previsto na Lei Orgânica de Assistência Social.

Para 2005, os dados do Legislativo não indicam mudanças. O orçamento do estado estima gastos de R$6,8 milhões nos programas sociais voltados para a população de rua. Os valores foram até suplementados, passando para R$ 9,7 milhões, e até agora R$2,7 milhões foram usados. A dotação inicial para programas dessa mesma área no município soma R$90,2 milhões. Com remanejamentos, os recursos caíram para R$42,4 milhões. Até semana passada, R$26,7 milhões tinham sido gastos.l