Título: Resgates de fundos multimercados atingem R$2,49 bilhões no semestre
Autor: Vagner Ricardo
Fonte: O Globo, 11/07/2005, Economia, p. 20

Juro alto estimula saques. Para analistas, aplicação tem risco a curto prazo

Os fundos multimercados, aqueles em que os gestores têm liberdade de aplicar em câmbio, ações, juros e títulos do governo, começam a perder o charme entre os investidores. Após os ganhos elevados registrados nos anos anteriores ¿ 16,61% em 2004 e 30,46% em 2003 ¿ desta vez a rentabilidade dos multimercados vem decepcionando, o que tem levado boa parte dos investidores a trocar de aplicação este ano. E foram justamente os fundos multimercados que lideraram os resgates da indústria do setor, com saques de R$2,495 bilhões só no primeiro semestre.

Grande parte dos investidores migrou para outros investimentos ¿ alguns de olho nas elevadas taxas de juros (a Selic está hoje em 19,75% ao ano). No fim do mês passado, havia 95 fundos multimercados, com patrimônio total de R$19 bilhões.

Ganho é superado pela renda fixa e pelo CDI

No primeiro semestre, o rendimento dos fundos multimercados, com maior e menor exposição ao risco, foi de 7,2% a 8,28%, respectivamente. Um desempenho inferior ao do CDI (referência para as aplicações financeiras), de 8,93%, e dos conservadores fundos de renda fixa, de 8,80% no período. Em 2004, o rendimento dos multimercados acompanhados pelo site Fortuna variou de 17,01% a 19,88%. Esse desempenho superou a variação de 16,17% do CDI ou os 17,81% do Ibovespa.

Segundo o economista Marcelo D¿Agosto, do site Fortuna, a boa rentabilidade de 2004 fez os investidores voltarem a apostar as fichas nesse segmento, garantindo uma captação de R$2,4 bilhões nos primeiros meses do ano. Mas os ganhos reduzidos mês a mês acabaram afetando a captação, com pesadas retiradas nos dois últimos meses. Até porque, após a interrupção no ciclo de alta da Selic, os investimentos em juros prefixados tornaram-se uma boa aposta, tendo em vista a perspectiva de ganhos maiores em um cenário de queda dos juros.

Após fim da CPMF para investimento, resgate cresce

Na avaliação de Hélio França, professor de Estratégia Financeira do Ibmec, a debandada de recursos dos fundos multimercados era esperada após a criação da conta-investimento, o mecanismo pelo qual os investidores não precisam mais pagar a CPMF na troca de aplicações.

¿ Antes havia um custo operacional relativamente alto na troca de investimento, que era a CPMF. Mas, no caso dos fundos multimercados, o gestor podia escolher os ativos sem precisar desaplicar parte da cota e pagar a CPMF. O fim da cobrança sobre transferências, a partir da conta-investimento, deu ao investidor a mesma liberdade do gestor de decidir onde manter os recursos. E como os ganhos foram considerados insuficientes, os aplicadores estão retirando o dinheiro ¿ explicou ele.

Para Renato Ramos, diretor de Renda Fixa da HSBC Asset Management, a migração dos fundos multimercados para outras aplicações é um fenômeno normal. E deve-se à rentabilidade inferior à de outras aplicações menos arriscadas, como fundos de renda fixa. Ele destaca que o ciclo de alta dos juros básicos traz um ganho bastante razoável para essas aplicações, afastando os investidores de opções de maior risco, como é o caso dos fundos multimercados.

D¿Agosto lembra que o comportamento dos fundos multimercados é afetado pelo desempenho de alguns ativos que integram sua carteira de investimento. A Bolsa, por exemplo, teve fortes oscilações, encerrando o semestre em queda de 4,37%. Já o dólar também decepcionou, registrando perdas de 11,45% nos seis primeiros meses do ano.

¿ O mercado ficou sem tendência no primeiro semestre e isso atrapalhou as estratégias dos gestores dos fundos multimercados¿ disse ele.

Retorno cresceria a médio e longo prazos

Na opinião do diretor Comercial da Máxima Asset Management, Hélio Braz, após os resultados favoráveis nos anos anteriores, os investidores de fundos multimercados habituaram-se a ganhos elevados, o que não é muito comum a curto prazo. A rigor, esses fundos tendem a superar o ganho do CDI a médio e longo prazos.

Para especialistas, os investidores que olham o rendimento mês a mês e ficam impacientes com o desempenho negativo a curto prazo não devem escolher os multimercados, porque as decisões dos gestores miram sempre resultados a médio prazo.

Analistas também não recomendam o troca-troca das aplicações, especialmente no caso daquelas que exibem ganhos acumulados maiores, porque a migração pode ocorrer em um período de maturação do investimento. Ou seja, há o risco de se migrar antes da hora e de se perder a reação do fundo original.