Título: FOCO DE TENSÃO
Autor:
Fonte: O Globo, 12/07/2005, Opinião, p. 6

Ao ceder o Ministério do Trabalho à CUT, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comete o mesmo erro do início de governo, quando terceirizou o Ministério do Desenvolvimento Agrário e o Incra, entregando-os ao MST ¿ um dos maiores símbolos do aparelhamento da máquina pública na sua gestão.

Com uma diferença, para pior: a terceirização do Ministério do Trabalho implica riscos mais graves. Políticos, por exemplo. Não se deve esquecer que o ministro indicado, Luiz Marinho, presidente da CUT, foi dos primeiros a atenderem à temerária convocação feita por José Dirceu aos tais movimentos sociais para defenderem o governo de uma inexistente conspiração ¿conservadora¿ e de ¿direita¿ ¿ quando a crise política, que acaba de implodir a cúpula do PT, é de origem ética e criminal.

Nesse sentido, é de se perguntar se o presidente, ao nomear Marinho, pensa em contar com um exército de reserva de militantes para ganhar as ruas caso os ventos da crise mudem de rumo e tomem a direção do Planalto.

Não há dúvida que, ao convidar Luiz Marinho, Lula importou mais um foco de tensão para dentro do governo. Não passou despercebido que a primeira promessa do ministro escolhido foi a de lutar por um salário-mínimo mais elevado. Nada mais previsível.

Como também é evidente que isso vai contra qualquer esperança de que a Previdência deixe de ser o mais importante fator de desestabilização das contas públicas. Ao contrário, dada a dependência do orçamento previdenciário em relação ao salário-mínimo.

O presidente Lula executa, mais uma vez, movimentos dúbios: acena positivamente para a proposta de redução do déficit nominal e de mais austeridade nos gastos públicos, mas coloca na equipe de ministros alguém contrário à idéia.

Com o agravante de que, com a escolha de Marinho, ele próprio, Lula, abre uma trincheira de resistência à política do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, mais do que nunca a principal viga de sustentação do governo ¿ ao lado do ministro Márcio Thomaz Bastos, da Justiça.

Numa visão otimista, pode-se imaginar que Luiz Marinho tenha aceitado o convite apenas para ajudar o amigo de lutas sindicais. Não é uma suposição plausível.