Título: GERAÇÕES DE RUA
Autor:
Fonte: O Globo, 12/07/2005, Opinião, p. 6

Nos anos 80 temia-se que o agravamento da exclusão social pudesse transformar grandes metrópoles brasileiras, como o Rio, em uma Calcutá, cidade da Índia onde várias gerações de pessoas sempre viveram nas ruas. Pois esse temor virou realidade, como mostrou O GLOBO no último domingo, ao reproduzir a história de Maiara Vasconcelos Ferreira, jovem negra de 18 anos, que há poucos dias teve o seu segundo filho, felizmente sadio, mas que já veio ao mundo sem muitas esperanças e perspectivas. A própria mãe tinha receio de que fosse um menino, admitindo que a possibilidade de o filho virar um bandido seria muito grande. Os filhos de Maiara são a terceira geração de uma família moradora de rua.

O drama dessa população é conhecido dos habitantes de grandes cidades brasileiras como o Rio. Trata-se de um problema de difícil solução e que não está ao alcance das entidades civis que se dedicam à caridade e apoio aos que tiveram a desventura de estar à margem da sociedade.

A responsabilidade básica é sem dúvida do poder público, que tem instrumentos, e até mesmo recursos orçamentários oriundos do pagamento de impostos e contribuições, para enfrentar esse grave e difícil problema. Mas nem sempre gasta o que está orçado.

A história de Maiara não é um caso isolado. Ele se repete e possivelmente continuará a se repetir, pois o que se faz para evitá-los é pouco. As autoridades municipais e estaduais sequer têm idéia da dimensão do problema: o número de moradores de rua no Rio é desconhecido. Se não sabemos quem são, o que fazem, de onde vieram, como tomar iniciativas para evitar que essa população de rua continue a crescer?

Existem programas oficiais de planejamento familiar ou orientados para a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis. Esses programas são em grande parte passivos, e despreparados para enfrentar a sua maior barreira: a ignorância. Miseráveis têm muito mais filhos que a média da população, não por opção ou desejo, mas por ignorância. A educação é essencial para se quebrar esse ciclo perverso da miséria, porém insuficiente. Controlar a população de rua, evitando-se a gravidez precoce e indesejada pode não ser tarefa fácil. Mas é possível.