Título: EUA E EUROPA APÓIAM PROPOSTA AGRÍCOLA DO G-20
Autor: Gilberto Scofield
Fonte: O Globo, 13/07/2005, Economia, p. 27

Para diplomatas reunidos na China, agora haverá avanço nas negociações da OMC para a redução dos subsídios

DALIAN (China). Numa reviravolta surpreendente, os diplomatas da União Européia (UE) e dos Estados Unidos, que vinham defendendo propostas próprias - impossíveis de serem aceitas pelos membros da Organização Mundial do Comércio (OMC) - para abertura de seus mercados agrícolas, decidiram abandonar suas teses e apoiar o G-20 (o grupo dos países em desenvolvimento que têm forte produção agropecuária, liderado por Brasil, Índia e China).

O representante de Comércio da Casa Branca, Rob Portman, chegou a radicalizar o discurso americano, que por muito tempo ressaltou a importância dos US$19 bilhões gastos em subsídios agrícolas, taxando a proposta do G-20 de tímida e afirmando que os EUA desejam acabar com todos os benefícios que oferecem hoje aos produtores rurais.

- A proposta do G-20 é um bom trabalho e um excelente ponto de partida para a discussão da redução das tarifas cobradas sobre os produtos agrícolas. Ela se move na direção correta, mas poderia ser mais agressiva, incluindo cortes maiores - disse Portman. - Ela recolocou a Rodada de Doha nos trilhos da negociação.

Cortes de subsídios têm de ser decididos ainda este mês

O G-20 propõe a redução dos subsídios por meio de um sistema de bandas. Além disso, fixa um máximo de 100% para sobretaxas de importações, sendo que, nos países em desenvolvimento, esse teto seria de 150%. No Japão, por exemplo, as sobretaxas sobre o arroz importado chegam hoje a 500%.

Portman disse que os EUA só não apresentam um projeto mais ousado de corte de barreiras tarifárias no setor agrícola porque outros países continuarão a proteger seus mercados:

- Meu presidente (George W. Bush) disse que está disposto a eliminar todos os subsídios agrícolas em cinco anos. Mas seria pouco realista fazer isso se outros países, como a União Européia, gastam três vezes mais com subsídios.

A expectativa, agora, é que as negociações avancem mais rapidamente. Os 148 países-membros da OMC têm de chegar ao fim deste mês com uma agenda de cortes definida.

Peter Mandelson, comissário de Comércio da UE, também mostrou entusiasmo pela proposta do G-20, mas ressaltou que ainda há muito a discutir sobre os grupos de produtos e os percentuais de redução.

A comissária de Produtos Agrícolas da UE, Mariann Fischerboel, afirmou que a Europa instruiu seus diplomatas a se empenharem ao máximo, nas próximas duas semanas, para fechar os números que serão apresentados na próxima reunião informal da OMC, no fim do mês, em Genebra.

O ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, estava exultante:

- A vitória da proposta do G-20 demonstra a iniciativa dos países agrícolas e, neste contexto, a liderança de um grupo que só faz se fortalecer - afirmou Amorim, que foi ontem para Paris encontrar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O ministro de Comércio da China, Bo Xilai, propôs que 2010 seja o prazo para que todos os membros da OMC eliminem de vez seus subsídios agrícolas.

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ENTENDA A PROPOSTA

MÉTODO: O acordo obtido diz respeito não ao tamanho da redução das tarifas agrícolas, mas sim ao método que será usado para reduzi-las. E o método faz diferença: a proposta antes defendida pela União Européia (UE) poderia levar a uma abertura de fachada.

BANDAS: A proposta do G-20, aceita por UE e EUA, prevê que os cortes de tarifas serão feitos em bandas, de acordo com o nível de proteção de cada país. Ou seja, os mais protecionistas terão que cortar mais. Em cada banda, a redução será linear. Originalmente, o G-20 defendia cinco bandas. Mas, ontem, já se falava em três bandas: a UE reduziria em maior grau seus subsídios, Japão e EUA entrariam na banda intermediária e, na outra, ficariam os demais países.

OUTRAS PROPOSTAS: Antes de aceitar a proposta do G-20, a UE pedia que o método de negociação fosse buscar um nível médio de proteção. Por esse método, a UE poderia reduzir muito as tarifas de produtos menos importantes para o comércio e manter elevadas as tarifas de itens de maior peso, chegando assim a uma tarifa média aceitável, mas que na prática representaria pouca abertura. Já os EUA antes pediam cortes não-lineares, que seriam proporcionais às tarifas máximas de cada país.

Entre os que discordam do apoio, o Japão

Limitar a tarifa de importação é um dos pontos divergentes

DALIAN (China). Nem todos os países comungaram da onda de otimismo que tomou conta das negociações informais da Organização Mundial de Comércio (OMC). O chamado G-10, formado pelos países que subsidiam e protegem fortemente seus setores agrícolas, como Japão, Coréia do Sul e Suíça, não gostou da proposta do G-20, mas se viu obrigado a aceitar a sugestão como ponto de partida para uma nova rodada de negociações diante do apoio de EUA e União Européia.

O ministro da Agricultura do Japão, Yoshinobu Shimamura, disse que os países do G-10 não aceitam a sugestão de limitar a tarifa de importação sobre agrícolas proposta também pelo G-20. No texto apresentado ontem pelo grupo, este teto é de 100%, no caso dos países desenvolvidos, e 150%, no caso dos países em desenvolvimento. Só no Japão, a tarifa sobre produtos agrícolas importados chega a 800% em alguns casos.

O ministro do Comércio Internacional do Canadá, Jim Peterson, qualificou a proposta do G-20 de tímida.(do enviado especial)