Título: Nas mãos de Delúbio
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 15/07/2005, O Globo, p. 2

Perpassa o PT o sentimento de que, passada a operação abafa, não adianta seguir com a operação disfarça. Estaria chegando a hora de explicar as relações financeiras com Marcos Valério e os saques no Banco Rural, evitando-se a sangria prolongada que se anuncia. O primeiro passo poderia ser dado por Delúbio Soares ao depor na CPI na quarta-feira.

Os deputados petistas que tiveram seus nomes associados a saques na agência de Brasília, feitos por parentes e assessores, conforme revelou ontem o ¿Jornal Nacional¿, serão chamados a dar explicação ao partido. Mas terão também que se explicar na CPI. Acredita-se que eles receberam ajuda da central de finanças operada por Valério para suas campanhas ou para o reforço de caixa das seções regionais do partido. O líder Paulo Rocha, por exemplo, é presidente do PT do Pará. Já teria confidenciado a amigos que recebeu uma ajuda para pagar dívidas.

Em outra frente, Valério deu ontem mais um sinal de que está com um plano de sobrevivência engatilhado, ao reunir-se com o procurador-geral da República, Antonio Fernando. Teria ido consultá-lo sobre as garantias que poderia receber em troca de uma colaboração nas investigações, tal como já prevê a legislação brasileira. O chamado a Delúbio teria sido para dizer que não ficará sozinho na cruz da execração. Tudo isso reforça a idéia da confissão dos pecados do partido, deles isentando-se o presidente Lula.

O violento discurso feito ontem pelo senador tucano Arthur Virgílio, dizendo que Lula ou é idiota ou é corrupto, já havia acendido a luz vermelha. Aparentemente isolado, ele se deu após uma inflexão no discurso tucano, descartando a tese da renúncia de Lula à reeleição. Na CPI, o deputado petista Henrique Fontana pedira ao representante da empresa Skymaster ¿ que tem com os Correios um contrato suspeito de irregularidades ¿ que confirmasse uma doação de campanha ao senador tucano. Desnecessária esta iniciativa, típica da tal operação disfarça, que se caracteriza por insinuações de que os adversários tenham também lá seus esquemas eleitorais. A reação de Virgílio, entretanto, foi desproporcional. Chegaram os petistas a um tal cerco na CPI que tudo o que dizem causa trovoada. Mas este episódio também reforçou a idéia de que é preciso abreviar a agonia. Do contrário, dizem os mais tranqüilos (e estes são os que parecem blindados mesmo), a procrastinação e a tergiversação só farão prolongar o desgaste para se chegar ao mesmo desfecho. Para o governo e o presidente, melhor que o partido vá para a expiação agora, quando Lula ainda mantém a popularidade alta e a economia continua invulnerável à crise.

A revelação da resistência da popularidade de Lula pela pesquisa CNT/Sensus também calou fundo na oposição. Se arrefeceu o ímpeto de alguns, estimulou o de outros, como Virgílio e o líder do PFL, Rodrigo Maia, que nas últimas horas dedicou-se a fazer o cruzamento que mostrou os saques de petistas na conta do Banco Rural.

Por fim, há na CPI o estrelismo diante das câmeras, que levam a cenas como a de ontem, quando o deputado Arnaldo Faria de Sá, mesmo sabendo que já haviam sido encaminhados documentos originais e nos devidos termos, em que Dirceu, Delúbio, Sílvio Pereira e a atual direção do PT abdicavam de seus sigilos bancários, fiscal e telefônico, vociferou como se estivesse em curso uma tentativa de evitar tal providência. Para quem via em casa, pela TV, o PT estava em plena obstrução da quebra do sigilo. Há uma diferença de leitura política entre abdicar deles ou brigar para mantê-los. Por tudo isso, alguns petistas acham que é melhor explicar logo que Valério era o operador de finanças do partido.