Título: CPI acha notas frias nos documentos da DNA
Autor: Gerson Camarotti, Regina Alvarez e Geralda Doca
Fonte: O Globo, 16/07/2005, O País, p. 5

Pelo menos dois documentos emitidos pela agência de Valério para o BB não foram reconhecidos pela instituição

BELO HORIZONTE e BRASÍLIA. A CPI dos Correios identificou notas frias entre os papéis da DNA Propaganda apreendidos anteontem na casa do ex-carcereiro Marco Tulio Prata. Marco Tulio é irmão do contador Marco Aurélio Prata, um dos donos da Prata e Castro Associados, uma das empresas que respondem pela contabilidade das agências de Marcos Valério. Numa amostragem de cinco notas fiscais recolhidas pela CPI, pelo menos duas notas emitidas para o Banco do Brasil não são reconhecidas pela instituição. As notas fiscais da DNA 031230 e 031231 foram emitidas em 19 de agosto de 2003. A primeira é de R$540 mil e a segunda, de R$120 mil.

Segundo o BB, as duas notas não constam dos registros da instituição como pagas. Os integrantes da CPI também recolheram um nota emitida para o Ministério do Trabalho no valor de R$386 mil, outra para a Telemig Celular no valor de R$1,347 milhão e uma terceira de R$823 mil para o cliente Brasil Telecom.

- Como a DNA estava queimando essas notas de valores muito altos? Os indícios apontam para lavagem de dinheiro, já que esses valores entravam na contabilidade. Pelo menos nas notas emitidas para o Banco do Brasil, está claro que eram frias. Vamos agora requerer às instituições públicas e privadas que enviem à CPI a segunda via dessas notas. Temos que identificar se elas foram pagas e se os serviços contratados foram executados - disse a senadora Heloísa Helena (P-SOL-AL).

As notas encontradas foram emitidas em nome de órgãos públicos, como o Banco do Brasil, Eletronorte e Ministério do Trabalho, que são clientes da agência. Algumas das notas chegam a R$1 milhão. Elas se referem ao pagamento de veiculação de peças publicitárias em veículos de comunicação. Parlamentares da CPI que analisaram os documentos acreditam que esses serviços não foram prestados.

- A tentativa de incinerar os documentos já indica que houve irregularidade. O mais provável é que sejam notas frias - disse o deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ).

Notas estavam com as quatro vias, o que é irregular

Algumas das notas encontradas nas 12 caixas de documentos estavam com as quatro vias, o que é outra evidência de irregularidade. O deputado Onyx Lorenzoni (PFL-RS), que faz parte da comitiva de parlamentares que veio a Belo Horizonte conferir os documentos, informou que a maior parte das notas é de 2002, 2003 e 2004.

- A legislação determina que esses documentos sejam mantidos na empresa por cinco anos. Nenhum empresário que não tenha o que esconder destruiria notas fiscais de 2004 - disse o deputado.

No fim da manhã, mais notas fiscais com a marca da DNA Propaganda foram encontradas parcialmente carbonizadas, em um lote vago no município de Contagem, próximo à casa de Marco Tulio Prata. Um morador da região teria avisado a uma emissora de TV, que chamou a polícia. Uma equipe da Corregedoria foi até Contagem e recolheu os documentos, que também vão ser periciados.

Os peritos acreditam que cerca de 200 caixas de documentos da DNA de 1998 e 2002 possam ter sido incinerados nas últimas 24 horas no local. Nos pedaços de notas que restaram, que couberam em uma sacola, era possível identificar a marca da DNA propaganda e ver que se tratavam de notas fiscais emitidas para a Eletronorte, Ministério do trabalho e outras empresas com valores em torno de R$200 mil.

Investigação será mantida em sigilo

O Ministério Público estadual confirmou que os documentos encontrados em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, envolvem empresas e órgãos públicos, incluindo os governos federal e estadual. Em nota distribuída à imprensa, a procuradoria reafirma a disposição de apurar e de cooperar nas investigações com a CPI dos Correios. Entretanto, a investigação será mantida em sigilo.

Dois senadores e três deputados da CPI estiveram em Belo Horizonte para analisar os documentos apreendidos pela Polícia Civil. Os parlamentares ficaram impressionados com a diversidade dos documentos, emitidos em favor de empresas públicas e privadas. As notas tinham valor de face variando entre 600 reais e um milhão de reais. O que mais chamou a atenção do deputado Jamil Murad, do PCdoB de São Paulo, foi o fato de que boa parte dessas notas estava guardada nas caixas com as quatro vias, o que, segundo os parlamentares, está sendo entendido por técnicos da Receita como um forte indício de lavagem de dinheiro:

- Técnicos da Receita Federal que nos acompanhavam, analisando, ainda falaram que um dos mais provável seria a sonegação ou a destruição de documentos. A outra seria que estes documentos poderiam ser apenas para receber dinheiro sem ter serviço prestado.

Legenda da foto: POLICIAL DE MINAS exibe alguns documentos encontrados num lote