Título: O faz-de-conta dos juros
Autor: Patricia Eloy
Fonte: O Globo, 17/07/2005, Economia, p. 27

Taxa de bancos e financeiras em empréstimos a aposentados é até o triplo da informada

Aposentados e pensionistas do INSS estão levando gato por lebre quando o assunto é o crédito consignado com desconto em folha de pagamento. Levantamento feito pelo GLOBO nas duas últimas semanas constatou que em agências de oito instituições financeiras, no Centro do Rio - Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, Fininvest, Losango, BMG, Banco Panamericano, Banco GE e IbiCred - a taxa efetivamente cobrada chega a ser mais de três vezes superior à informada na hora da consulta para os empréstimos. Em alguns casos, parcelas com juros anunciados de 1,75% ao mês correspondem, na verdade, a uma taxa final de quase 5,5% ao mês, o que aumenta o peso das parcelas no bolso dos clientes. Outras duas instituições procuradas (Santander e Mercantil do Brasil) negaram-se a fazer a simulação do empréstimo.

Como diz o ditado, o diabo está nos detalhes. Os juros informados não costumam incluir a Taxa de Abertura de Crédito (TAC), cobrada para o cliente ter acesso ao crédito, e o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que, acrescidos da parcela mensal do empréstimo, jogam as taxas efetivamente cobradas nas alturas. No entanto, sem essas duas cobranças, não é possível contratar a linha de crédito. Há casos, como o da Caixa Econômica Federal, em que o cliente precisa ainda pagar, junto com as mensalidades, um seguro obrigatório que banca eventuais prejuízos que a instituição possa ter no caso de falecimento do aposentado.

Diretor: taxa efetiva de 1,75% não existe

Denúncias de fraudes nesse tipo de financiamento fizeram o Ministério da Previdência mudar, na última segunda-feira, as regras para concessão do crédito. Agora as instituições terão de informar previamente a taxa que incide sobre o empréstimo, assim como outras taxas ou tarifas cobradas no financiamento.

A maior diferença entre taxas foi encontrada na Fininvest - que pertence ao Unibanco. Para um empréstimo de R$3 mil, a taxa de juros informada no balcão da loja foi de 1,75% ao mês. Cálculos do economista Miguel Ribeiro de Oliveira, vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac) mostram que as taxas embutidas no valor parcelado - R$347,44 em 12 vezes - são de 5,47% ao mês. Descontado o valor da TAC (de R$105, financiada junto com o valor emprestado), ainda assim é superior à informada: 4,81%. Isso significa um juro anual de 75,72%. Para efeitos de comparação, a taxa básica do país (Selic) é hoje de 19,75% ao ano.

Carlos Alberto Moura, diretor do Unibanco, diz que não se pode confundir taxas de simulação de empréstimo com as do contrato assinado.

- É no contrato que o cliente tem acesso a todos os detalhes, com o juro que incidirá sobre o período. Mas descarto qualquer possibilidade de erro de cálculo nas nossas lojas. Não somos um balcãozinho de empréstimo, mas uma financeira com mais de 250 lojas. Agimos considerando o que o cliente precisa e ele não está preparado para fazer operações financeiras. Mostramos o comprometimento de renda e quanto vai pagar todo mês, que é a informação que o cliente quer - afirma Moura. - Mas se você me perguntar se 1,75% é a taxa efetiva de algum empréstimo nosso, a resposta é não. Essa taxa não existe.

No Banco BMG - líder nesse segmento de crédito - as taxas também não casaram. Num empréstimo de R$2.994,17, foi informado que seria cobrada taxa de 1,68% ao mês, quando na verdade, segundo contas do economista e professor da FGV Luís Carlos Ewald, ela é de 3,39% ao mês. Roberto Rigotto, vice-presidente-executivo do banco, diz que a diferença pode ser resultado do período de carência da operação.

- É o tempo que demoramos para receber o dinheiro que o INSS descontou na folha do aposentado. Se esse período for superior a um mês, de 57 dias, por exemplo, os juros incidirão sobre esse período, não sobre 30 dias. Na prática, é difícil recebermos o dinheiro em cerca de um mês. O prazo é sempre maior e essa diferença bate na primeira parcela.

Perguntado se, então, não seria o caso de informar ao cliente quanto, efetivamente, ele pagará de juros no período, Rigotto responde:

- Damos às pessoas a informação necessária, para não confundir. As pessoas no balcão nem sempre têm todo o treinamento, mas a minha central de atendimento, sim - diz, ressaltando que as taxas informadas na loja - de 1,68% a 2,8% ao mês - estão erradas. A instituição cobra de 1,50% a 2,80% ao mês.

Em relação às diferenças de taxas na instituição (anunciadas em 1,9% e cobradas de 2,17% ao mês) o Banco do Brasil informou que deve ter havido erro de cálculo e que, na verdade, não é praxe de mercado passar ao cliente a taxa efetiva cobrada.

- É mais ou menos como quando um varejista anuncia um produto em dez vezes sem juros e, na verdade, a gente sabe que os juros estão embutidos no preço. Mas, agora, o INSS exige que todo mundo informe a taxa final - diz Denilson Molina, gerente-executivo de Empréstimos do BB.

Ele esclarece que as taxas na instituição são de 1,50% a 2,40% ao mês. Marcelo Velloso, diretor da Losango (onde a taxa informada foi de 3,38% e a cobrada, de 3,59% ao mês) creditou a diferença a arredondamento nas contas do economista da Anefac.

- Mas a primeira preocupação do cliente é com o valor da parcela, não com o juro - justifica Velloso.

No caso do Banco Panamericano (a taxa informada era de 1,65% ao mês ante taxa efetiva de 4,45% ao mês), o gerente da mesa de ativos Alessandro Segura argumentou que a diferença deve-se a período maior de recebimento dos créditos.

- Deve ser efeito da carência, que pode ser de 13, 15 dias além do prazo corrido de 30 dias.

Procuradas, CEF, IbiCred e Banco GE não se manifestaram. No meio do tiroteio de informações e discrepância entre taxas informadas e cobradas, fica o aposentado.

- Não fazemos as contas e a preocupação é ver se a prestação cabe no bolso. Deveriam dizer o juro cobrado - diz a aposentada Thereza Subtil, 77 anos. - Em junho, contratei um empréstimo de R$2.500 numa financeira e disseram que a taxa era de 1,75%.

Em seu caso, o juro mensal é, na verdade, de 2% a 2,5%.

COLABOROU Vagner Ricardo

CLIENTE PODE IR À JUSTIÇA E RECEBER EM DOBRO, na página 28

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