Título: AINDA OTIMISTAS
Autor: George Vidor
Fonte: O Globo, 18/07/2005, Economia, p. 18

Muitos segmentos da indústria continuam apostando em uma possível recuperação da economia brasileira neste segundo semestre - isso se o Banco Central deixar, é claro. Nos primeiros seis meses do ano, os financiamentos da Finame (subsidiária do BNDES) para compra de vários tipos de equipamentos aumentaram 125%. Nesse percentual não estão incluídas as máquinas agrícolas.

Problemas climáticos, recuo nas cotações do dólar e queda de preços de alguns produtos desestimularam o agricultores a assumir novos compromissos. Desse modo, os créditos para implementos agrícolas puxarão para baixo as estatísticas sobre vendas e financiamentos de máquinas como um todo este ano. Mas se esses dados forem analisados por setor, e não pelo conjunto, teremos revelações surpreendentes, como essa do salto de 125% nos créditos para compra de tornos, fresas, caminhões, etc.

Mesmo com o mercado interno travado pelas altas taxas de juros, uma parte da indústria ainda não parou de investir. Os economistas do BNDES ainda não encontraram explicação para esse fenômeno. Talvez essas indústrias tenham aproveitado os bons resultados financeiros de 2004 para renovar ou ampliar seu parque produtivo, comprando máquinas novas para ganhar mais eficiência, cortar custos. Podem também estar mais confiantes na provável recuperação da economia brasileira, que teria voltado a crescer a um ritmo de 4% ao ano.

Não se joga fora um entusiasmo como esse. Por isso, os membros do Comitê de Política Monetária (Copom) deveriam pensar duas vezes antes de decidirem na quarta-feira se vão manter as taxas de juros básicos no atual patamar, como espera a maioria dos analistas financeiros.

Se a taxa básica ficar em 19,75%, o Copom estará na prática apertando o torniquete monetário, pois, como a inflação caiu muito, em qualquer cálculo os juros reais vão subir. E desnecessariamente, já que mesmo com algum corte nas taxas básicas continuaremos ostentando os juros reais mais elevados do planeta, ainda que os índices de preços estejam em trajetória de queda.

Além disso, tudo indica que as contas públicas darão uma boa contribuição para segurar a inflação em 2005. Como o governo está meio atônito com a crise política, a máquina burocrática tende a se retrair no segundo semestre, e com isso poupará mais do que o programado (o superávit primário das contas públicas está mais para o equivalente a 5% do que para 4,25% do Produto Interno Bruto).

O déficit público como um todo será menor que o do ano passado se as taxas de juros chegarem a dezembro em torno de 18%. Para isso, o Copom precisa começar a reduzir os juros agora em julho. Uma queda de 0,25 ponto percentual (de 19,75% para 19,5%) não fará grande diferença no combate à inflação de imediato, mas representará uma tremenda economia para o Tesouro Nacional, estados, municípios, empresas e consumidores que dependem de crédito.

A dívida externa total do Brasil chegará ao fim deste mês à casa de US$195 bilhões, o valor mais baixo da década. O setor público responde por cerca de 65% dessa dívida, mas como o Banco Central administra aproximadamente US$60 bilhões em reservas, pode-se dizer que o endividamento sem cobertura é da ordem de US$65 bilhões, ou 10% do Produto Interno Bruto (PIB).

Tal dívida pode "desaparecer" no prazo de cinco anos, se o Brasil continuar acumulando saldos expressivos na balança comercial.

Entre amortizações e juros da dívida, o Brasil paga por ano US$50 bilhões aos credores no exterior. A proporção é de US$36 bilhões em vencimentos da dívida, e US$14 bilhões em juros anuais.

Com a queda do risco Brasil, a tendência é de que essa conta de juros encolha um pouco, possivelmente para US$13 bilhões em 2006. De qualquer forma, a amortização do principal continuará na faixa de US$35 bilhões por ano. Entretanto, o saldo dos investimentos estrangeiros e da conta de bens e serviços deve gerar um excedente anual entre US$15 bilhões e US$20 bilhões no mercado brasileiro, que poderão ser adquiridos pelo setor público, seja para reforçar as reservas cambiais ou para pagamento de juros e dívidas.

O governo quase não tem receitas em moeda estrangeira. Então o setor público só paga compromissos no exterior se comprar dólares excedentes no próprio mercado brasileiro ou contratar novas dívidas.

A temporada de furacões no Caribe e Golfo do México só acaba em setembro. Quatorze furacões ainda poderão se formar na região. O risco de tempestades afetar a produção, juntamente com o receio de novos atentados, é que vem alimentando a especulação com os preços do petróleo. A demanda mundial por óleo não deverá crescer mais do que 1,9% este ano, e isso não justificaria cotações acima de US$60 por barril.

A convite da Federação Brasileira da Indústria Farmacêutica (Febrafarma), Luiz Affonso Romano historiou o controle dos preços de medicamentos no Brasil de 1940 aos dias atuais. O próprio Romano, hoje consultor da Fundação Getúlio Vargas, é personagem dessa história, pois participou da equipe do então ministro Roberto Campos, depois de 1964, e era um dos controladores de preços.

O risco da Argentina se igualou ao do Brasil na última semana. Não há precedente no mercado de uma recuperação de crédito tão rápida, mas não é isso que tem chamado a atenção dos analistas de investimento, e sim o fato de o risco Brasil não ter caído vertiginosamente.