Título: DEVASTAÇÃO NO IRAQUE
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Fonte: O Globo, 18/07/2005, O Mundo, p. 20

Al-Qaeda assume 15 atentados em 2 dias. Parlamentares propõem milícias antiterror

A explosão de três carros-bombas elevou ontem para 15 o número de atentados suicidas ocorridos em Bagdá e na principal estrada iraquiana em 48 horas. A rede terrorista al-Qaeda assumiu a autoria da onda de ataques e disse que seu objetivo é tomar a capital. Mas nenhum desses atentados foi tão devastador quanto o que ocorreu sábado à noite na cidade de Musayyib, onde um terrorista suicida explodiu um caminhão-tanque-bomba, matando 98 pessoas e ferindo 156.

A violência desenfreada pôs o governo iraquiano sob forte pressão. Numa atitude incomum, parlamentares iraquianos realizaram uma tensa sessão extraordinária em que acusaram o governo de não conseguir frear os terroristas. Por isso, eles pediram a formação de milícias locais em substituição à polícia e aos soldados.

- Os planos dos ministérios do Interior e da Defesa para impor segurança no Iraque fracassaram e não detiveram os terroristas. Precisamos trazer de volta as milícias populares - afirmou um respeitado parlamentar, Khudair al-Khuzai.

O aiatolá xiita Ali al-Sistani, a mais respeitada autoridade religiosa do país, também defendeu a criação de grupos armados nas cidades para defendê-las de terroristas.

Analistas advertiram que milícias poderiam fomentar a violência sectária interna.

- Num país sem um Estado, as pessoas vão buscar segurança e serviços de maneira direta. Previsivelmente, vão buscá-los num nível muito baixo, e então surgem milícias para fornecer segurança nos bairros - disse, em Londres, Toby Dodge, especialista em Iraque.

O atentado em Musayyib foi o mais violento desde que o governo iraquiano tomou posse, em abril, e o segundo maior desde que os EUA invadiram o Iraque, em março de 2003. A 60 quilômetros de Bagdá, a cidade fica numa região perigosa que as tropas americanas chamam de "triangulo da morte". A apenas 30 quilômetros está Hilla, cidade que registrou em fevereiro o mais violento atentado, no qual 125 pessoas morreram.

Retirada britânica começaria em 1 ano

Em Musayyib, uma multidão furiosa protestou ontem contra a violência diante de prédios destruídos pela explosão, enquanto máquinas removiam escombros em busca de vítimas. Moradores reclamaram que o governo proibira a entrada de caminhões na cidade, mas não impediu que o terrorista suicida pusesse o caminhão-bomba num local onde pudesse causar o maior número de mortes: perto de uma mesquita xiita e de um movimentado mercado.

A al-Qaeda não assumiu especificamente a autoria do atentado em Musayyib, mas no sábado dissera, em mensagem na internet, que os ataques da semana faziam parte de uma nova ofensiva. Só na sexta-feira, 11 atentados suicidas mataram mais de 33 pessoas e feriram mais de cem. A rede terrorista assumiu a autoria dos três atentados de ontem em Bagdá, que mataram nove pessoas e feriram 24.

Em sua primeira entrevista a uma empresa de comunicação ocidental, o clérigo xiita radical Moqtada al-Sadr - que já liderou duas rebeliões contra a presença das forças americana no Iraque - disse ontem à rede britânica BBC:

- A resistência é legítima em todos os níveis, seja religioso, intelectual ou qualquer outro. A primeira pessoa que deveria admitir isso é o presidente americano (George W.) Bush, que tem dito: "Se meu país for ocupado, combaterei."

Em Londres, o secretário de Defesa, John Reed, afirmou ontem que o Reino Unido deverá começar a retirar suas forças do Iraque nos próximos 12 meses, entregando gradativamente a segurança a forças iraquianas:

- Isto não acontecerá agora, será um processo. Acho que é um processo que poderá começar não além dos próximos 12 meses.

Os ataques do fim de semana

MUSAYYIB: A explosão de um caminhão-tanque-bomba dirigido por um terrorista suicida matou sábado 98 pessoas e feriu 156, perto de uma mesquita e de um mercado movimentado. Foi o segundo maior atentado desde o início da ocupação.

BAGDÁ: Um suicida lançou ontem um carro-bomba contra uma patrulha iraquiana, matando três policiais e ferindo 14 pessoas. Num posto policial, outro atentado semelhante matou um civil e feriu três. O terceiro atentado do dia na capital foi contra a sede da Comissão Eleitoral. Cinco pessoas morreram e sete ficaram feridas.

MOSSUL: A sede de um partido político foi incendiada ontem depois de uma operação de forças iraquianas. Testemunhas disseram que soldados haviam sido atacados e que um deles foi morto.

RAMADI: Os corpos de dois trabalhadores contratados pelo Exército dos EUA foram encontrados, ontem, pela polícia.

MAHMUDIYA: Uma pessoa morreu e duas ficaram feridas ontem, quando rebeldes dispararam contra um grupo que participava de um funeral que seguia para Najaf pela principal estrada do país.

ISKANDARIYA: A explosão de um carro-bomba matou ontem um soldado.

Legenda da foto: A ÁREA do atentado em Musayyib: o segundo mais violento desde o início da guerra