Título: BUSH MUDA DISCURSO E EVITA DEMITIR ASSESSOR
Autor: José Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 19/07/2005, O Mundo, p. 27

Presidente prometera afastar funcionário que identificara agente da CIA, mas agora diz que crime não foi provado

WASHINGTON. Um ano atrás, o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, prometeu que, assim que a Justiça descobrisse qual tinha sido o funcionário da Casa Branca que revelara à imprensa a identidade de uma espiã da CIA (Agência Central de Inteligência) especializada em armas de destruição em massa, ele o demitiria imediatamente.

Ontem, porém, quando lhe perguntaram novamente a respeito do mesmo assunto, o presidente fez uma sutil mas significativa alteração em sua promessa:

- Se alguém aqui cometeu um crime, não vai mais trabalhar em meu governo - afirmou Bush.

Detalhes de testemunho agora revelados

Havia uma claro motivo para a mudança no discurso: sabe-se, agora, que uma das pessoas que fizeram aquela revelação a vários jornalistas é Karl Rove, o principal estrategista político da Casa Branca, conselheiro de Bush desde a época em que ele era governador do Texas e também seu subchefe de Gabinete. A outra é Lewis Libby, chefe de Gabinete do vice-presidente Dick Cheney.

Rove e Libby foram denunciados pelo repórter Matthew Cooper, da revista "Time", em depoimento ao procurador federal Patrick Fitzgerald, que está investigando o caso relacionado à divulgação do nome da agente da CIA, e que o intimara a depor. O jornalista descreveu vários detalhes de seu testemunho na edição da revista desta semana, que chegou ontem às bancas, alimentando ainda mais o escândalo. E isso, aparentemente, obrigou o presidente a alterar sua promessa.

A questão parece se concentrar, agora, num exercício de interpretação que caberá ao procurador federal definir. Uma lei de 1982 determina que é crime um funcionário do governo revelar a identidade de um agente secreto. No entanto, os advogados de Rove e Libby, assim como o Partido Republicano, vêm alegando que eles não cometeram crime algum porque não mencionaram o nome da espiã.

Segundo Cooper, os dois funcionários de fato não pronunciaram o nome da espiã - Valerie Plame Wilson - mas foram muito claros a respeito: disseram a ele que "a esposa do embaixador Wilson" era da CIA, era especializada em armas de destruição em massa e tinha sido responsável por uma viagem dele à África. Não foi difícil para o repórter descobrir o nome dela.

Uma forma de o governo americano se vingar

O motivo de tal revelação - que, ao ser publicada, foi atribuída a "altas fontes do governo" - também parecia claro: uma forma de o governo se vingar do embaixador Joseph Wilson, pelo fato de ele ter publicado, poucos dias antes, um artigo no jornal "The New York Times" em que dizia ter sido enviado pela CIA ao Níger, numa missão especial para investigar se Saddam Hussein havia adquirido urânio naquele país para produzir armas nucleares.

No Níger, Wilson constatou que tal negócio jamais fora feito, mas o presidente Bush - num discurso à nação - usou a informação mentirosa para reforçar sua justificativa para invadir o Iraque.