Título: As entradas
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 26/07/2005, O Globo, p. 2

A partir de agora, a CPI dos Correios, ou pelo menos alguns de seus membros, começa a se concentrar na identificação dos abastecedores das contas de Marcos Valério. Isso é importante não apenas para confirmar a ocorrência de desvio de dinheiro público mas também para desvendar a teia de interesses privados que atuava à sombra do esquema Valério-Delúbio.

Não foi certamente por afinidade ideológica que alguns grandes grupos econômicos destinaram recursos à tesouraria petista paralela montada pela dupla. Da mesma forma, é importante conhecer a evolução das duas agências mineiras que se transformaram num mega esquema de financiamento político. Há indicações de que elas já atuavam como biombo para as relações entre políticos e financiadores de campanha em 1998. Isso é importante não para pegar tucanos ou pefelistas, como podem desejar alguns petistas, mas para que se desvende a economia invisível movida a corrupção e tráfico de influência que levam à desmoralização da política. Estranhamente, porém, os bancos Rural e BMG têm omitido informações sobre o período anterior a 2003, embora a quebra do sigilo tenha sido aprovada para os últimos cinco anos.

O deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ) desceu ontem para os porões da CPI decidido a examinar apenas as ¿entradas¿ nas contas de Valério. O essencial, nas saídas, já está revelado, e em breve o STF dará o mapa completo da mina, entregando à CPI a lista dos sacadores apreendida pela Polícia Federal em suas diligências. O essencial é que partidos e políticos governistas foram beneficiados, devendo ocorrer agora apenas a ampliação da lista.

Eduardo Paes está convencido de que os contratos de publicidade das empresas de Marcos Valério, descontados os gastos com produção e veiculação de mídia, resultam em recursos líquidos muito inferiores à movimentação observada. Logo, diz ele, é preciso saber quem abastecia aquelas contas, que interesses tinham no governo e no que foram atendidos.

Converge ele com a senadora petista Ideli Salvatti, também concentrada na busca dos depositantes e dos interesses conexos.

¿ E não é para disfarçar responsabilidades dos petistas envolvidos. O PT não tem saída fora da apuração total mas a CPI fará meio serviço se não quiser enxergar o todo.

Meio serviço, diz ela, é o que as CPIs sempre fazem. Cassam os corruptos e ignoram os corruptores.

Do mundo de interesses ainda não revelados pela CPI, há algumas pistas na entrevista de Oséas Duarte ao jornal ¿O Povo¿, de Fortaleza. Membro do diretório nacional do PT, ex-secretário de Comunicação do partido, ele insinua que Delúbio, como pessoa física, estava metido em tenebrosas transações podendo ter havido enriquecimento ilícito. Diz que José Guimarães, o deputado estadual que é irmão de José Genoino, precisa dizer tudo o que sabe sobre a prisão de seu assessor com dólares na cueca. Ele saberia quem mandou o assessor buscar dinheiro em São Paulo. Antes, Oséas fez diversas referências ao envolvimento de Delúbio e Valério com o grupo Opportunity. Duas de suas empresas, Telemig e Amazônia Celular, são clientes de Valério. Outro que tentou associar o estouro do esquema financeiro petista à briga das teles foi Henrique Pizzolato, ex-diretor do Banco do Brasil e da Previ.

As apurações precisam dar conta de tudo isso.