Título: FALTA DE MATÉRIA-PRIMA AMEAÇA COMBATE À AIDS
Autor: Leonardo Valente
Fonte: O Globo, 26/07/2005, Ciencia e Vida, p. 28

Mesmo quebrando patentes, Brasil é dependente de importações para produzir medicamentos que distribui

O programa de distribuição de medicamentos anti-retrovirais do governo brasileiro para o tratamento da Aids estará comprometido em alguns anos se o país não produzir matérias-primas para a fabricação dos remédios. A afirmação foi feita ontem pelo diretor do Programa Nacional de DST/Aids, Pedro Chequer, na 3ª Conferência da Sociedade Internacional de Aids sobre Patogênese e Tratamento, que está sendo realizada no Rio.

Segundo Chequer, o desafio do governo vai além de negociar preços com grandes laboratórios ou quebrar patentes das drogas. É ter condições de produzi-las no país sem a necessidade de importação de insumos e materiais.

¿ Esse problema não se refere somente aos medicamentos com patentes. Existem remédios que já perderam o direito de patente, mas que não podemos produzir sem importar matéria-prima. Esse é um problema grave, pois faz com que continuemos reféns do mercado internacional, mesmo quando conseguimos condições legais para produzi-lo ¿ disse Chequer.

Em fevereiro, a reprovação pelo Ministério da Saúde de matéria-prima importada da China e da Índia, considerada de baixa qualidade, fez com que a produção de AZT fosse atrasada, prejudicando a distribuição em várias regiões.

¿ Estamos estudando formas de produzirmos essas matérias-primas numa parceria envolvendo indústrias brasileiras públicas e privadas. Temos condições tecnológicas para isso, o que nos dará a independência necessária para a continuidade do programa ¿ contou ele.

País só produz 20% dos medicamentos

Na década de 90, o país produzia 45% dos medicamentos que utilizava no tratamento da Aids. Com o desenvolvimento de novas drogas e a resistência de muitos pacientes às terapias antigas, a produção nacional caiu para 20%, muitos deles feitos com matérias-primas importadas.

Segundo o presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Celso Ramos, essa proporção se tornou desfavorável ao país:

¿ Temos dados que mostram que em São Paulo novos infectados tem cepas de vírus que não respondem mais aos tratamentos antigos. Isso torna a necessidade de novas drogas cada vez maior.

A despeito do acordo anunciado pelo laboratório Abbott para a redução do preço do Kaletra (que faz parte do coquetel), Chequer não descartou a possibilidade de o governo vir a quebrar a patente do remédio. Segundo ele ¿não há nenhum documento que obrigue o governo a cumprir a medida¿.

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