Título: A COLIGAÇÃO PT-PSDB-PFL
Autor: ELIO GASPARI
Fonte: O Globo, 27/07/2005, Opinião, p. 7

É dura a vida da choldra. O comissariado petista é apanhado comendo com a mão, guardando dólares na cueca, e o presidente da República resolve ensinar aos cretinos que "o PT fez, do ponto de vista eleitoral, o que é feito no Brasil sistematicamente". Ou seja, fizemos o que os outros fizeram. Mama quem pode e obedece quem tem juízo.

Passam uns dias e a patuléia fica sabendo que o deputado Roberto Brant, ex-ministro do tucanato aninhado no PFL, foi beneficiário de uma valeriana de R$150 mil. O doutor recebeu a pronta e irrestrita solidariedade do seu partido. Nada de novo, em 1999 o pefelê levou seis meses para expulsar o deputado Hildebrando Paschoal, aquele cujos sequazes esquartejavam as vítimas com serras elétricas. Brant foi para o ataque: "Quem não tiver recebido dinheiro não contabilizado, que atire a primeira pedra."

A patuléia aprendeu duas lições:

O PT fez o que todo mundo faz.

O PFL faz o que todo mundo faz e ninguém tem autoridade para criticar o doutor Brant.

O terceiro ensinamento veio com a revelação de que em 1998 a coligação que batalhava pela reeleição do governador mineiro Eduardo Azeredo foi bafejada por um empréstimo valeriano de R$11,7 milhões, tomado no Banco Rural, igualzinho ao de 2003 para o PT. Azeredo é hoje um grão-tucano, presidente do PSDB. Respondeu à denúncia com uma aula: "Passaram-se três eleições, não faz sentido discutir uma campanha de 1998."

Ou seja: malfeitoria de tucano prescreve em sete anos e "não faz sentido" nem lembrar o assunto.

Lula, Brant e Azeredo comportam-se como se fossem marqueses numa ilha tropical, fazendo à patuléia o favor de governá-la. A corrupção eleitoral não os diferencia. Pelo contrário, os associa. Juntam-se na cobiça do andar de cima e no descaso pelo andar de baixo.

Eles não generalizam a prática da malfeitoria com o propósito de combatê-la, mas para impô-la. Lula, Brant e Azeredo tratam as maracutaias contábeis como se elas fossem um acidente geográfico: o Pão de Açúcar fica à esquerda de quem entra na barra e minha prestação de contas é uma fantasia aritmética. Tratam o assunto com a arrogância de coronéis do sertão, mas falta-lhes a coragem para dizer essas coisas durante as campanhas eleitorais.

Se o dinheiro que foi para as cuecas petistas tivesse saído do bolso de Brant, ou de Azeredo, tudo bem. Da mesma forma, se os jabaculês do PSDB e do PFL viessem da caixa do Delúbio, tudo se resumiria a uma ação entre amigos. O problema é que todo esse dinheiro, até o último centavo, tem uma só origem: a bolsa da choldra, e ela paga impostos europeus por serviços africanos.

Lula, Brant e Azeredo poderiam percorrer o Brasil como uma trinca caipira, explicando as virtudes políticas de seus partidos e as semelhanças financeiras de seus costumes.

ELIO GASPARI é jornalista.