Título: NÚMERO DE INDIGENTES CRESCEU EM ÁREAS URBANAS
Autor: Letícia Lins
Fonte: O Globo, 28/07/2005, O País, p. 14

Pesquisadora diz que miséria aumentou entre a população economicamente ativa e diminuiu entre aposentados

RECIFE. A população de indigentes de 16 a 60 anos cresceu de 38% para 49% entre 1981 e 2003 na área urbana do país. No mesmo período, o total de pessoas em situação de miséria, em todas as faixas etárias, aumentou de 9.749.395 para 18.104.736. Foi o que informou ontem a professora Lena Lavinas, titular da cadeira de política social da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Autora do livro ¿Programas sociais e combate à fome¿, ela exibiu gráficos mostrando que a política econômica adotada no governo anterior, e mantida no atual, não provocará grandes mudanças para os pobres brasileiros.

Lena criticou programas como o Bolsa Família e considerou tímidas as ações governamentais que visam à transferência de renda. Segundo ela, o valor de R$75 repassado mensalmente a famílias pobres representa por dia apenas 50 centavos per capita.

¿ É quase nada ¿ afirmou a professora, que fez as observações no XIV Simpósio Internacional de Desenvolvimento Social, que começou ontem em Recife, com especialistas de todos os continentes.

Numa tabela, ela mostrou que, enquanto a indigência aumenta na faixa de até 60 anos, o fenômeno se inverte a partir dessa faixa etária devido a pensões e aposentadorias. No Brasil urbano, 4% das famílias têm renda per capita igual ou inferior a um salário-mínimo, percentual que chega a 2% a partir dos 65 anos.

¿ Tirando a Previdência, as transferências de renda não passam de 7%. Isso não é nada para as necessidades do Brasil ¿ disse a pesquisadora.

Suas observações deixaram em situação desconfortável o secretário nacional de Assistência Social, Osvaldo Russo, que procurou enaltecer os benefícios do Bolsa Família.

¿ Quem critica o programa é porque desconhece os avanços. Hoje temos 7,3 milhões de famílias recebendo o Bolsa-Família, que serão 11 milhões ao fim do governo. Podemos dizer que cerca de 50 milhões de pessoas recebem benefícios sociais. Eles já ajudam 65% das famílias que recebem menos de cem reais per capita. Até o fim do governo todas as famílias estarão recebendo ¿ afirmou Russo, lembrando que o Bolsa Família consome R$6,7 bilhões anuais.

Áreas rural e urbana têm números parecidos

Mas Lena Lavinas mostrou que a pobreza no Brasil avança entre os trabalhadores, só caindo entre os aposentados. Ela disse que 93% das transferências de renda são para pessoas que contribuíram para a previdência. Segundo a professora, a população urbana em idade produtiva que recebe até um quarto de salário-mínimo vem crescendo significativamente no país. O número de brasileiros de famílias que ganham até meio salário mínimo per capita cresceu de 43% para 52% na população de 16 a 60 anos. De acordo com a pesquisadora, os números da área rural são semelhantes aos registrados nos centros urbanos.

Lena observou que atualmente 20% do PIB servem para reforçar o superávit primário. Para ela, se essa política não fosse adotada cada criança pobre poderia ganhar R$80 em benefícios sociais.

¿ O governo diz que o investimento social não pode aumentar, mas o gasto financeiro sim. Isso só vai incrementar a pobreza e degradar o tecido social. A saída não é simplesmente dar aos pobres, mas criar um sistema social universal que dê mais aos que mais precisam ¿ propôs.

Ela lembrou o caso dos telefones celulares, que, disseminados no país, viraram símbolo de ascensão social.

¿ O que os pobres não sabem é que estão pagando 33% de imposto para ter um celular. Infelizmente no Brasil, os pobres têm 27% de sua renda comprometida com impostos, enquanto os ricos comprometem apenas 7% com essas obrigações ¿ comparou.