Título: APOIO POPULAR É ESTRATÉGIA DE LULA PARA SALVAR GOVERNO
Autor: Ilimar Franco/Cristiane Juncgblut/Luiza Damé
Fonte: O Globo, 31/07/2005, O País, p. 16

Ao mesmo tempo que ataca, presidente afaga as elites

BRASÍLIA. Para garantir a sobrevivência política de seu governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva está dando uma no cravo e outra na ferradura. Num dia afirma que não se curvará às elites que querem tirá-lo do poder, e no outro faz um afago a essas mesmas elites dizendo que nada o fará se afastar do ajuste e do equilíbrio fiscal.

O presidente, no esforço para aparentar normalidade, retomou viagens pelo interior num ritmo acelerado e tem participado de solenidades com representantes dos movimentos sociais, dos quais espera apoio contra a ação da oposição.

Nas ruas, Lula fica sujeito a manifestações radicais

Nessas solenidades, Lula aproveita para dizer que ninguém é mais ético do que ele, reagindo à enxurrada de acusações de corrupção contra seu governo. Mas ao percorrer o país, ele também fica sujeito, como seus antecessores, a manifestações de forças radicais de esquerda, como as organizadas pelo PSTU e o PSOL quinta-feira, em Porto Alegre.

¿ Os contatos com o povo são da alma do presidente. Ele sempre volta revigorado dessas viagens ¿ diz o ministro da Coordenação Política, Jaques Wagner.

Os assessores do presidente rejeitam a versão de que sua movimentação obedeça a uma estratégia de marketing. Argumentam que se trata de uma reação intuitiva baseada em sua própria percepção da crise política. Lula faz ataques às elites porque acredita que elas gostariam de vê-lo de cabeça baixa. E faz questão de afirmar que ¿ninguém é mais ético que ele¿ porque não aceita assumir a condição de suspeito de ter cometido qualquer desvio.

¿ O objetivo do presidente é governar. Por mais difícil que seja a situação política ele não pode ficar submerso na crise e nas denúncias. Não pode ficar paralisado. Isso não é uma tática, é uma obrigação ¿ diz um de seus conselheiros.

Mas cientistas políticos e marqueteiros vêem na estratégia de Lula uma tentativa de manter ao seu lado um setor da população que sempre lhe deu apoio e que ainda demonstra confiança nele, segundo as pesquisas. A tendência, avaliam, é que o apoio das classes mais baixas puxe também as camadas intermediárias. A estratégia é tida como arriscada e temporária, uma vez que os formadores de opinião não estão convencidos de sua inocência.

O cientista político Malco Camargos, professor da PUC de Minas Gerais, vê na atitude de Lula mais do que uma estratégia eleitoral para 2006. É um plano para garantir a governabilidade, diz. Camargos ressalta, no entanto, que a estratégia é arriscada e lembra o incidente em Porto Alegre, quando a comitiva de Lula foi alvo de ovos e pedras:

¿ É um comportamento arriscado. Neste momento, qualquer contato com a população pode provocar reações.

Os políticos da oposição acreditam que o discurso do presidente obedece a uma estratégia montada pelo publicitário Duda Mendonça para criar uma polarização na qual o presidente dos excluídos enfrenta a oposição dos ricos. O presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC), diz que esse discurso é equivocado:

¿ Se obedece a alguma estratégia de marketing é um tiro no pé. Ele está falando ao léu.

Para o líder do PSDB, senador Arthur Virgílio (AM), o presidente emite sinais contraditórios para a sociedade, numa demonstração de que ele está perdido na crise.

¿ É um discurso desestabilizador. Ele fica bem com a elite quando faz o discurso da austeridade, mas fica mal quando faz ataques genéricos a ela ¿ critica Arthur Virgílio.

Mas para o cientista político Malco Camargos, em termos de discurso, essa é a única saída para Lula. Na sua avaliação, ele procura ampliar sua base na sociedade e reunir aliados nos setores organizadas da sociedade:

¿ Lula está juntando o seu rebanho, está buscando as classes populares organizadas, os trabalhadores, os sindicatos. Se perder esse apoio, fica sem alternativa. Tanto como estratégia eleitoral para 2006, quanto para garantir a governabilidade, é importante que ele tenha esse apoio.