Título: Tarifa de rico, bolso de pobre
Autor: Mirelle de França e Ramona Ordoñez
Fonte: O Globo, 31/07/2005, Economia, p. 31

Peso da assinatura do telefone fixo no salário-mínimo é bem maior no Brasil

Afaxineira Maria da Luz Marques ficou dividida entre manter o telefone fixo para saber notícias de seus três filhos, ou aumentar a quantidade de compras no supermercado. Com o coração apertado, ela decidiu colocar mais comida em casa. Devolveu a linha e comprou um telefone celular, com o objetivo de apenas receber ligações. Maria da Luz faz parte de um exército de usuários para os quais manter um telefone fixo, devido ao preço da assinatura, ficou inviável. Com o móvel pré-pago, ela gasta cerca de R$10 por mês, o que representa uma economia de R$80 no seu orçamento.

¿ Sempre fui contra o pagamento da assinatura, que é muito cara. O serviço de telefone fixo poderia ser igual ao de luz, onde a gente só paga o que gasta ¿ disse Maria.

A população mais pobre do Brasil, com renda de apenas um salário-mínimo (R$300) por mês, é a que mais sente o peso da cobrança mensal da assinatura de telefonia fixa que, em média, é de R$39. No bolso desse consumidor, ter telefone em casa significa gastar em média 13,1% do orçamento para ter acesso ao serviço. Já nos países ricos e emergentes, esse custo cai para até 1,55%, caso da França, onde é cobrada uma tarifa de 6,49 euros para os que recebem o piso salarial de 417,98 euros, segundo levantamento feito pelo GLOBO (veja quadro ao lado).

Ministro: fim de assinatura poderá trazer reajustes

Quando assumiu o Ministério das Comunicações, Hélio Costa fez referência à comparação. E, na semana passada, governo e empresas se reuniram para discutir o fim da assinatura. Segundo o ministro, a Lei Geral das Telecomunicações não prevê a cobrança. Ele ainda uso como argumento o fato de a maior parte dos consumidores sequer fazer uso da franquia de cem pulsos embutida na tarifa.

¿ O ideal é que o usuário pague apenas pelo que consumir. Mas as empresas têm sido intransigentes no que diz respeito ao fim da assinatura ¿ disse Costa ao GLOBO.

O fim da assinatura, no entanto, pode não significar um alívio no bolso dos consumidores. O ministro admitiu que, caso a cobrança seja suspensa, as empresas deverão ser compensadas devido à perda de receita com a assinatura, estimada em 25% do seu faturamento. Essas perdas podem prejudicar novos investimentos no setor.

¿ As empresas têm razão, em parte, quando afirmam que o fim da assinatura pode prejudicar seus investimentos. Portanto, alguma coisa pode ser reajustada para atender a eliminação completa da assinatura aos consumidores ¿ afirmou o ministro.

Para atender a baixa renda, Costa disse que no início de 2006 devem entrar em operação os serviços de telefonia fixa pré-paga.

O presidente da Abrafix, associação que reúne as operadoras de telefonia fixa do país, José Pauletti, disse que as declarações do ministro têm sido equivocadas, principalmente em relação à assinatura, podendo gerar incertezas no mercado, prejudicar investimentos e criar falsa expectativa nos usuários. Segundo ele, a tarifa é legal e está prevista em contrato:

¿ A tarifa tem como contrapartida a disponibilidade ininterrupta da linha telefônica e de serviços de atendimento e manutenção. Ela só é cobrada de quem opta pela comodidade de ter a linha telefônica dentro de casa.

Sobre a franquia de pulsos, Pauletti ressaltou que se trata de um bônus dado pelas empresas. Por isso, segundo ele, a tarifa de assinatura não é uma exigência de consumo mínimo, mas uma remuneração pelos custos fixos com a disponibilização do serviço.

Para a WeDo Consulting uma saída para o fim da assinatura é alterar o regime tributário atual, que aumenta em até 60% o preço para o usuário, segundo as empresas.

¿ O acesso seria democratizado, sem obrigar as operadoras a compensar a perda com outras cobranças ¿ disse Akira Taguti, da consultoria WeDo no Brasil.

Em julho passado, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) entrou com ação civil pública na Justiça Federal paulista contra a cobrança da assinatura, por considerá-la ilegal.

¿ A cobrança da assinatura, entre outros problemas, fere o Código de Defesa do Consumidor, já que o valor embute uma franquia de cem pulsos que pode, ou não, ser usada pelo consumidor de telefonia fixa.

Já para Renato Guerreiro, ex-presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e sócio da Guerreiro Consult, o usuário de baixa renda sairá perdendo com o fim da assinatura:

¿ A compensação das empresas deverá causar reajuste dos pulsos. Isso afeta os orelhões usados pelos pobres. O ideal é oferecer serviços menos completos e, portanto, mais baratos e o governo reduzir impostos.

AMERICANOS TÊM PREÇOS E SERVIÇOS PARA TODOS OS BOLSOS, na página 32