Título: PAÍS TEM MAIOR CICLO DE INVESTIMENTO EM 20 ANOS
Autor: Martha Beck
Fonte: O Globo, 31/07/2005, Economia, p. 37

Pesquisa do Iedi prevê US$20 bi até 2010. Mas incerteza política ameaça projetos que ainda não saíram do papel

BRASÍLIA. A indústria de base brasileira passa hoje por um ciclo de investimentos que não se vê há 20 anos. Isso é o que mostra um trabalho do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), que analisou um conjunto de 198 projetos no valor de US$20,4 bilhões. São obras que foram anunciadas em 2004 para serem concluídas até 2010 e estão concentradas nos setores siderúrgico, de refino de petróleo, químico e de papel e celulose.

Segundo o diretor-executivo do Iedi, Júlio Gomes de Almeida, o diferencial desses investimentos é que eles não são apenas de ampliação de fábricas já implantadas, e sim de construção de novas unidades, o que ajuda a desenvolver diferentes regiões do país e a gerar empregos. Mas ele alerta para o risco de que, apesar desse quadro positivo, a atual crise política pode afetar as decisões das empresas em relação a novos investimentos.

¿ Mesmo não incluindo todos os setores, o quadro de investimentos na indústria de base é muito positivo. Mas o nosso medo é que novos projetos sejam postos na gaveta por causa da questão política ¿ afirma Almeida.

Crise política preocupa, mas não é tudo para as empresas

Essa também é a avaliação do vice-presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), Guilherme Duque Estrada:

¿ A crise política nos preocupa. Acho que ela ainda não interferiu nos investimentos, mas pode acabar adiando decisões sobre futuros projetos.

Estrada destaca, no entanto, que os investimentos também dependem de outras questões, como infra-estrutura, complexidade do sistema tributário e altas taxas de juros. Segundo ele, são pontos importantes para as empresas que querem apostar no mercado brasileiro.

¿ As empresas do setor químico têm tido um desempenho positivo, mas muito aquém do potencial ¿ explica o vice-presidente executivo da Abiquim.

¿ Muitas empresas estão aguardando melhora na situação cambial para poder fazer novos investimentos. A crise política é apenas mais um fator. Mas o Brasil é maior do que tudo isso e as instituições são maiores que a crise ¿ afirma o presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Papel e Celulose (Bracelpa), Osmar Zogbi.

É nisso que apostam os investidores dos 198 projetos, que foram reunidos pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e analisados pela equipe do Iedi. Um deles, por exemplo, é a construção de uma montadora da Hyundai na cidade goiana de Anápolis. A obra está sendo realizada pela Caoa, maior distribuidora da Ford na América Latina e atual importadora e distribuidora da Hyundai no país. O projeto soma mais de US$200 milhões.

O vice-presidente executivo do Instituto Brasileiro de Siderurgia (IBS), Marco Polo Lopes, também aposta que o ambiente de negócios no Brasil vai se manter positivo, apesar das turbulências na área política. Segundo ele, mesmo com uma política monetária conservadora, que mantém os juros altos, e com um câmbio desfavorável, a política econômica brasileira tem dado sinais positivos ao investidores.

¿ Independentemente do cenário político, a política econômica vem mantendo uma certa blindagem. Além disso, nós pensamos a longo prazo e ninguém espera agora uma crise política que dure dois, três ou quatro anos ¿ diz Lopes.

Ele ressalta que, além dos investimentos da área siderúrgica que são apontados pelo Iedi, o setor já tem programados outros US$12,6 bilhões destinados a aumentar a capacidade instalada das empresas de 34 milhões de toneladas para 49,7 milhões de toneladas até 2010.

¿ O objetivo é continuar abastecendo o mercado interno e manter uma participação significativa no mercado externo ¿ disse Lopes.

Júlio Gomes de Almeida também destaca que outra vantagem dos novos projetos para o país é ajudar a aumentar a capacidade instalada das empresas, que, em diversos setores, está próxima de 100%.

¿ Sem essa expansão, nós acabaríamos esbarrando na capacidade instalada, o que prejudicaria não apenas a produção interna, mas também as exportações ¿ disse Almeida.

Sudeste é a região mais beneficiada

Entre as regiões, o Sudeste é o maior beneficiado pelos investimentos: US$10,1 bilhões. Em segundo lugar está o Nordeste, US$6,2 bilhões, seguido pelo Centro-Oeste,US$1,7 bilhão. Os locais mais valorizados pelos investidores são os pólos industriais de Camaçari, na Bahia, e Manaus (AM). Mas o documento do Iedi também destaca que está havendo uma interiorização desses investimentos, especialmente em São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.