Título: LONGE DOS OLHOS, MAS NO CALO DA CASA BRANCA
Autor: José Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 31/07/2005, O Mundo, p. 42

Pouca coisa irrita tanto o governo Bush quanto perguntas sobre o paradeiro de Bin Laden, procurado há dez anos

WASHINGTON. As duas perguntas são simples, claras e diretas. Mas têm causado incomodo nos círculos oficiais dos Estados Unidos. O desconforto é visível assim que as 14 palavras são pronunciadas nessa sequência: ¿Quando, afinal, vocês vão prender Osama bin Laden? Vocês sabem onde está Bin Laden?¿

Pouco depois dos atentados em Nova York e Washington em setembro de 2001, o presidente George W. Bush fez uma promessa solene em público, bem a seu estilo:

¿ Como diziam aqueles cartazes lá do Velho Oeste, vamos capturá-lo vivo ou morto.

Hoje, quase quatro anos depois, o nome do líder terrorista desapareceu nos discursos públicos. E quando algum repórter insiste em lembrar a promessa, como aconteceu nos últimos dias, a resposta mais clara que encontra são olhares fulminantes e expressões faciais de aborrecimento.

Silêncio sepulcral e mal-estar na Casa Branca

Há até mesmo reações de incredulidade, não pelo fato de Bin Laden não ter sido apanhado, mas pela aparentemente irritante insistência de cobrar um compromisso ainda não cumprido.

¿ Isso é com autoridades de outra área ¿ disse um funcionário do Departamento de Estado, transmitindo ao jornalista brasileiro a reposta do porta-voz Sean McCormack.

Donald Rumsfeld, o secretário de Defesa, estava no Iraque quando as perguntas foram dirigidas ao Pentágono pelo GLOBO. Dois dias depois, o funcionário do setor afirmou:

¿ Todos os esforços continuam sendo feitos na caça a Osama bin Laden. A tarefa, evidentemente, expandiu-se: não é apenas sua cabeça que nos interessa.

A Casa Branca mantém um silêncio sepulcral a respeito. No FBI (polícia federal americana), a reação também é de mal-estar. E a resposta, enfadonhamente formal:

-¿ As investigações continuam abertas. Quando acontecer, vocês saberão.

Bin Laden entrou na lista do FBI dos criminosos mais procurados há dez anos. No site da agência, o cartaz de ¿Procura-se¿ informa que ele é canhoto, caminha apoiado num bastão, é magro e conhecido também como ¿O Príncipe¿, ¿O Emir¿ e ¿O Diretor¿. Diz ainda que o prêmio por sua captura é de US$27 milhões e que se deve ¿considerar que está armado e é perigoso¿.

Esforço dos EUA para pressionar o Paquistão

A própria imprensa americana parece ter se esquecido do assunto. Nenhum dos responsáveis diretos pela caça a Bin Laden ¿ e muito menos Bush ¿ têm sido cobrados a respeito em entrevistas. Porter Goss, o diretor da CIA (Agência Central de Inteligência) foi o único pressionado. Abordado por Timothy J. Burger, da revista ¿Time¿, deu uma resposta intrigante:

¿ Tenho uma excelente idéia sobre onde está Bin Laden. Quando vamos pegá-lo? Esta é uma questão que vai bem mais fundo do que você pensa. Na cadeia de situações necessárias para terminar com êxito a guerra contra o terrorismo temos elos frágeis. Até que os fortaleçamos, provavelmente não vamos ser capazes de trazer Bin Laden à Justiça. Temos feito um bom progresso, mas há a difícil questão de lidar com santuários em países soberanos.

Michael Scheuer, há 22 anos na CIA, onde criou e chefiou a Unidade Osama bin Laden ¿ comandando a caçada por três anos ¿ e atualmente aposentado, disse que Goss exagerou no conhecimento do paradeiro de Bin Laden. E denunciou:

¿ Acredito que a explicação de Goss, insinuando que o respeito dos EUA à soberania do Paquistão impediu a captura ou morte de Bin Laden, é um esforço centralizado do governo para pressionar o presidente do Paquistão (Pervez Musharraf) a cumprir a promessa de fazer mais para eliminar Bin Laden em seu território. Ele deixou claro que o governo se importa mais com o que os outros pensam do que em defender os americanos quando tem essa chance.

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