Título: Sem cobertura
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 30/07/2005, O Globo, p. 2

Compreende-se a grita contra a tentativa de acordo entre deputados do PP e do PL com o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, para interromper o espetáculo paralelo do Conselho de Ética. Vazado, o acordo já falhou, mas se consumado será uma pizza sem cobertura, que não impedirá a cassação de pelo menos 19 deputados que devem ser incriminados pela CPI.

O processo ali aberto contra o deputado Roberto Jefferson, se levado a termo, irá inocentá-lo, na medida em que se confirma sua acusação de que deputados governistas receberam dinheiro de Marcos Valério. Se mensalmente ou não, é secundário.Tão logo Jefferson deu sua primeira rajada, um dos atingidos, o deputado Valdemar da Costa Neto, do PL, passou o carro na frente dos bois pedindo a abertura de processo de cassação contra ele por quebra de decoro junto ao Conselho. Ficou assim impedido de renunciar. Valdemar bravateou para mostrar que nada devia ou temia. Passaram-se 40 dias de CPI e aí estão os saques de Jacinto Lamas, ex-tesoureiro do PL, batendo em R$1,65 milhão. Aí está Genu, assessor do PP, confirmado que pegava dinheiro no Banco Rural para o líder José Janene e os deputados Pedro Correa e Pedro Henry, também apontados por Roberto Jefferson. Por esta acusação, acabará inocentado.

É preciso diferenciar a tentativa de acordo no âmbito do Conselho de Ética dos entendimentos políticos para domesticar a crise, promovendo a convivência entre investigação e normalidade institucional, sem prejuízo das punições.

Já no Conselho, tudo o que acontecer antes do fim das investigações será espuma. Jefferson pode ser cassado é por crime eleitoral ao preço de R$4 milhões ou por envolvimento em esquemas de corrupção nos Correios e no IRB. Mas isso depende ainda da conclusão dos trabalhos da CPI. Quanto aos outros deputados, a apresentação de um pedido de cassação agora é até prematura, embora já exista uma fartura de indícios e até de provas. Mas o processo no Conselho só andará quando forem formalmente apresentados. Não cumprindo sua ameaça de pedir logo a cassação de seus desafetos, Jefferson até nos poupará de audiências inconclusivas que servirão ao exibicionismo, não às investigações.

O que importa mesmo é o resultado final das investigações da CPI dos Correios e também da outra, a do mensalão. E pelo menos a primeira, até agora, não está dando motivo para que se tema a apresentação de uma pizza tamanho gigante. Se o acordão ainda vingar, desatará iras, protestos e desconfianças mas não evitará o inevitável. Dificilmente serão frustrados os que esperam na terça-feira o depoimento de José Dirceu com Jefferson na primeira fila pronto para o duelo. É recomendável que ninguém leve armas brancas ou de fogo.