Título: Mercado `tira de letra¿ a crise política, diz secretário de Tesouro dos EUA
Autor: Martha Beck e Ronaldo D'Ercole
Fonte: O Globo, 02/08/2005, Economia, p. 24

Ministro Furlan afirma que segmentos da indústria já estão sendo afetados

BRASÍLIA e SÃO PAULO. O secretário do Tesouro dos Estados Unidos, John Snow, disse ontem que o mercado financeiro está dando um voto de confiança ao Brasil. Em visita ao país, ele se encontrou com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e disse que os investidores estão ¿tirando de letra¿ a crise política.

¿ Isso confirma o meu argumento básico de que o que conta é o comprometimento com uma boa política macroeconômica e a expectativa de que ela vai continuar ¿ afirmou. Além do presidente, Snow se reuniu com investidores de capital de risco, com o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e com o ministro da Fazenda, Antonio Palocci.

Snow apresenta proposta para estimular investimento

Segundo o secretário, as autoridades brasileiras destacaram que a economia está numa trajetória forte de crescimento, enquanto a inflação cai. Palocci também disse a Snow que o crucial agora é manter as conquistas já feitas e dar andamento a uma reforma microeconômica.

¿ Essa reforma torna a economia mais resistente e ajuda a reduzir a pobreza. Isso mostra que o Brasil está no caminho certo ¿ disse Snow.

O secretário defendeu ainda uma proposta para estimular investimentos em infra-estrutura no hemisfério. A idéia é criar uma estrutura de avaliação de projetos de investimento, como as Parcerias Público-Privadas (PPPs), que ajude os investidores a selecionar onde aplicar seus recursos. Segundo Snow, a estrutura poderia funcionar no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e ajudar diferentes países.

Para o secretário, a nova estrutura daria uma espécie de selo de garantia aos projetos. No Brasil, ele considera que o setor de transportes é um dos que mais precisam de recursos dos investidores. A idéia de Snow vai ser apresentada hoje, no Rio, durante a IV Reunião do Grupo Brasil-Estados Unidos para o Crescimento.

Mas se Snow está certo de que a economia brasileira tira de letra a crise política, o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, tem dúvidas. Ontem, ele disse que, embora os números mostrem que a economia está de certa forma separada da crise política, os negócios de alguns segmentos da indústria já estariam sendo afetados pela insegurança que o quadro atual transmite aos consumidores.

¿ O consumidor, bombardeado pelo noticiário, acaba ficando reticente e postergando alguma decisão ¿ disse Furlan, depois de participar da abertura da 24ª Feira Internacional de Vendas e Exportação de Móveis (Fenavem 2005), em São Paulo.

Para ministro, economia dá sinais contraditórios

Para o ministro, entretanto, as informações vindas da economia neste momento são contraditórias e, por isso, difíceis de serem interpretadas corretamente. Furlan questionou também o aumento do pessimismo dos empresários diante da crise:

¿ Talvez o melhor termômetro seja analisar os balanços das companhias abertas, para ver que há uma dicotomia entre o discurso e a percepção emocional dos empresários e a realidade dos números.

Ao comentar os resultados da balança comercial em julho, o ministro observou também que o fato de as importações terem ficado estáveis, apesar do câmbio amplamente favorável à expansão, é outro indicador de acomodação da demanda interna. Tal comportamento, segundo ele, é uma indicação clara de que não existe inflação de demanda no país. Este dado, disse Furlan, deve ser levado em conta pelo Comitê de Política Monetária (Copom) nas suas próximas reuniões.