Título: DO RURAL, ESQUEMA PASSOU PARA CORRETORAS
Autor: Bernardo de la Peña e Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 03/08/2005, O País, p. 10

Ano passado, dinheiro passou a ser repassado para a Bônus Banval e para a Guaranhuns, em SP

BRASÍLIA. Em seu depoimento à Polícia Federal anteontem, a diretora financeira da SMP&B Propaganda, Simone Vasconcelos, revelou que o esquema de repasse de recursos ao PT e seus aliados foi alterado em 2004 por determinação do empresário Marcos Valério. O sistema de saques em dinheiro na agência Brasília do Banco Rural, iniciado em janeiro de 2003, foi substituído por depósitos nas contas da corretora Bônus Banval, quando o dinheiro era destinado ao PT, e para a empresa Guaranhuns Empreendimentos, Intermediações e Participações Ltda, quando destinado ao deputado Valdemar Costa Neto (PL-SP), que renunciou anteontem ao mandato.

Simone, que será ouvida hoje na CPI dos Correios, contou que tinha ¿verdadeiro pavor¿ de sair do Banco Rural com grandes quantias em dinheiro e que, por isso, teria solicitado certa vez um carro forte para transportar R$650 mil até o prédio da Confederação Nacional do Comércio, onde funcionava a filial da SMP&B em Brasília. No hall do prédio, parte desses recursos teria sido entregue a José Luiz Alves, ex-assessor do Ministério dos Transportes ligado ao PL, e a Jacinto Lamas, ex-tesoureiro do PL.

Policial levava dinheiro para sócia de Duda Mendonça

Ela confirmou ainda ter entregado pessoalmente dinheiro a Jair dos Santos e ao ex-presidente da Eletronorte Emerson Palmieri, ambos ligados ao PTB; a Pedro Fonseca, ligado ao PT nacional; a João Cláudio de Carvalho Genu, assessor do líder do PP, José Janene (PR); e a Roberto Costa Pinho, ex-assessor do Ministério da Cultura.

A gerente administrativa revelou ainda a conexão do publicitário Duda Mendonça com o esquema de saques montado por Valério. Seguindo orientação da sócia do publicitário, Zilmar Fernandes da Silveira, a SMP&B autorizava o policial civil David Rodrigues Alves a sacar recursos no Banco Rural em seu lugar. O policial também será ouvido hoje na CPI dos Correios. A revelação de que Duda Mendonça teria sido beneficiado com mais de R$15 milhões surpreendeu integrantes da CPI.

¿ Realmente é uma quantia muito elevada recebida por Duda Mendonça. Mas o mais importante do conjunto do depoimento de Simone é que ela confirma a existência do mensalão, na medida que revela que os saques não eram esporádicos, mas periódicos ¿ observou o deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ).

Em seu depoimento à PF, Simone disse que nunca entregou dinheiro diretamente ao ex-deputado Valdemar Costa Neto; ao ex-presidente do PTB José Carlos Martinez; ao líder do PP; ao ex-líder do PMDB deputado José Borba (PR); e ao deputado Bispo Rodrigues (PL-RJ).

Saques se tornaram rotineiros a partir de 2003

Segundo ela, Borba foi autorizado a sacar dinheiro no Banco Rural, mas como se recusou a assinar comprovante de recebimento, ela foi obrigada a ir à agência para assinar o documento e permitir o repasse ao deputado.

Simone garantiu que não conhecia Roberto Marques, e que nunca ouviu dizer nada a respeito dele. Marques seria assessor do ex-ministro José Dirceu. Negou que tenha participado da distribuição de dinheiro em qualquer hotel, rebatendo o depoimento da ex-secretária de Valério Fernanda Karina Somaggio. A maior parte dos recursos sacados, no entanto, teria sido distribuída na própria agência, onde os beneficiários relacionados por Valério eram identificados por dois funcionários do Rural, Francisco e Renato. Segundo Simone, o primeiro saque em dinheiro no Rural foi feito em janeiro de 2003. A partir daí, os saques teriam sido rotineiros.

Reforçando a versão já apresentada por Valério e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, Simone disse acreditar que tanto os saques feitos em seu nome e entregues a terceiros como os depósitos nas contas da Bônus Banval e Guaranhuns referiam-se aos empréstimos feitos por Valério junto ao BMG e ao Banco Rural destinados ao PT.