Título: Dirceu pode responder por quebra de decoro
Autor: Evandro Éboli
Fonte: O Globo, 06/08/2005, O País, p. 5

Para consultoria da Câmara, mesmo quando era ministro petista 'continuou deputado, não perdendo o seu mandato'

BRASÍLIA. A Consultoria Legislativa da Câmara recomendou ontem ao Conselho de Ética a abertura de processo por quebra de decoro parlamentar sobre o deputado e ex-ministro da Casa Civil José Dirceu (PT-SP). O presidente do conselho, Ricardo Izar (PTB-SP), havia encomendado o estudo à consultoria por causa de dúvidas lançadas pelo próprio Dirceu, que alegou não poder ser processado por algo ocorrido quando ele era ministro. Mas a consultoria da Câmara concluiu que, mesmo no período em que ocupou o cargo de ministro, Dirceu "continuou deputado, não perdendo o seu mandato".

A representação contra Dirceu foi feita na última terça-feira pelo presidente em exercício do PTB, Flávio Martinez.

"O deputado federal investido no cargo de ministro continua deputado não perdendo seu mandato. Ele fica sujeito a todas as restrições e impedimentos decorrentes de seu status de parlamentar. Acreditamos que existem razões jurídicas suficientes para dar seguimento à representação oferecida em desfavor do deputado José Dirceu, com a conseqüente instauração do processo por quebra de decoro parlamentar", afirma José Theodoro Menck, assessor da consultoria e autor da análise.

No texto, o técnico lembra que, em casos anteriores, a Câmara dos Deputados já examinou a tese de que atos cometidos antes do exercício do mandato podem se constituir em quebra de decoro parlamentar. Menck cita três exemplos de políticos cassados mesmo não estando no exercício do mandato: o de Talvane Albuquerque (PTN-AL), acusado de ser o mandante do assassinato da deputada Ceci Cunha (PSDB-AL), de quem era suplente; Hildebrando Pascoal (sem partido-AC), acusado de tráfico de influência, liberação de salvos-condutos para traficantes e assassinatos; e Féres Nader, (PTB-RJ), cassado na CPI dos Anões do Orçamento, quando era suplente, acuso de desviar recursos de subvenções sociais para suas faculdades.

Representação já está na Mesa

Em seu depoimento ao Conselho de Ética, Dirceu disse que, quando ocorreram os fatos relativos ao suposto mensalão, ele era ministro e que não há base legal para ser cassado por crime de responsabilidade e nem pode perder o mandato por quebra de decoro por estar licenciado do mandato. Não é esse o entendimento da Consultoria Legislativa da Câmara, que concluiu que José Dirceu pode responder nas duas esferas jurídicas: no STF, por ter foro privilegiado, responderia por crime de responsabilidade, e no Conselho de Ética por quebra de decoro.

A representação do PTB contra Dirceu já foi enviada do Conselho de Ética para a Mesa Diretora. O processo contra o deputado no conselho só estará aberto, de fato, quando o conselho receber de volta a representação da Mesa. Assim, o conselho instaura imediatamente o processo e o parlamentar não pode mais renunciar a seu mandato.

A partir da abertura do processo começa a contar o prazo de 90 dias para deliberação do plenário da Casa sobre a cassação ou não. Mas quem irá ditar esse ritmo é o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE). Antes, Severino analisará as seis representações encaminhadas pelo PL contra parlamentares do PTB.

A tendência é que Ricardo Izar decida pela abertura do processo disciplinar contra Dirceu. A assessoria de José Dirceu informou que o ex-ministro discorda do parecer do consultor da Câmara.

Legenda da foto: DIRCEU: o deputado alegou que não poderia perder o mandato por estar licenciado à época das denúncias