Título: CPI monta força-tarefa para devassar valerioduto
Autor: Jose Casado
Fonte: O Globo, 07/08/2005, O País, p. 14

Grupo de auditores fará investigação em bancos, estatais, fundos de pensão, corretoras, ministérios e empresas

BRASÍLIA. Numa ação sem precedentes, a CPI dos Correios mobiliza a partir desta semana mais de uma centena de auditores de Tribunal de Contas da União (TCU), Ministério da Fazenda, Banco Central, Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e Secretaria de Previdência Complementar, do Ministério da Previdência. Eles vão se somar a meia centena de agentes da Receita Federal, da Polícia Federal, e do Ministério Público, já envolvidos em tempo integral nas investigações.

No alvo estão 12 bancos públicos e privados, 14 empresas estatais, 11 fundos de pensão mantidos por estatais, oito corretoras privadas, cinco ministérios, 19 empresas privadas e dois fundos públicos de investimento.

É uma força-tarefa e, a princípio, deve agir fora do padrão ¿ ou melhor, sem o estilo policial recorrente no noticiário sobre fraudes contra a administração pública. Estabeleceu-se a discrição como norma, e por isso os fiscais devem atuar como se estivessem em trabalho de rotina, realizado de maneira dispersa pelos órgãos envolvidos. O ponto de convergência é a CPI.

Governo, TCU e CPI querem cautela na investigação

Essa cautela é resultado tanto do desejo do governo e do TCU quanto do presidente da comissão, senador Delcídio Amaral (PT-MS), e do relator, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR).

¿ Quanto mais cuidado, melhores serão os resultados ¿ argumenta Delcídio.

¿ É uma etapa decisiva -¿ diz Serraglio.

As motivações são distintas. O governo, claro, por estar no centro da confusão. O TCU, pelo zelo de sua característica de órgão técnico de assessoria do Legislativo. E os comandantes da CPI, porque querem minimizar riscos típicos de investigações abrangentes e espalhafatosas, que costumam resultar na perda de foco e na inviabilidade de resultados políticos, como aconteceu na recente CPI do Banestado.

O êxito da iniciativa só será mensurável a partir da segunda quinzena de agosto, quando a CPI prevê começar a divulgar relatórios e listas de nomes de parlamentares passíveis de processos de cassação de mandato, por quebra de decoro. O caráter de prioridade foi atestado pelo TCU, cujo presidente, Adylson Motta, na semana passada mandou paralisar as auditorias em andamento e deslocou cem analistas de controle externo para essa investigação.

"É um delicado momento em que as instituições públicas são postas em xeque¿, justificou Motta em comunicado interno.

O quadro de órgãos, entidades, empresas públicas e privadas relacionado ao inquérito aberto no Congresso expressa a dimensão e a multiplicidade das ações sob suspeita ¿ em diferentes setores da economia ¿ protagonizadas por integrantes do governo, do partido do governo, o PT , e da base aliada, com conexões no setor privado.

Vai além dos limites conhecidos da ação do empresário Marcos Valério de Souza, considerado o operador do mensalão, que contratava empréstimos bancários sem garantias, distribuía dinheiro à base aliada e atuava na corretagem de grandes negócios privados, cujo desfecho dependia de decisões do núcleo do governo.

O valerioduto é o eixo da investigação parlamentar, mas as denúncias recebidas na CPI lançam suspeita sobre um processo de corrupção e irregularidades mais amplo dentro de órgãos, entidades e empresas públicas.

A comissão pediu ao Banco Central para fazer auditagens especiais nos Bancos Rural e BMG, incluindo todos os acordos feitos com o setor público para empréstimos em consignação na folha de pagamentos. Quer detalhes sobre a origem e o destino de recursos que transitaram pelas contas de meia centena de pessoas físicas e jurídicas nos bancos Bradesco, HSBC, Basa e Interatlântico. E deverá convocar o banqueiro Daniel Dantas, do grupo Opportunity, para depoimento sobre depósitos milionários em contas de empresas de Valério.

Fiscalização abrangerá também recursos do FAT

Ao mesmo tempo, o TCU vai fazer uma fiscalização emergencial em contratos considerados suspeitos do Banco da Amazônia, Banco do Brasil, Banco do Nordeste, Banco Popular e BNDES. E nas aplicações de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e do Fundo Nacional de Segurança e Educação do Trânsito.

Ao Ministério da Fazenda e à CVM a CPI solicitou levantamento de investimentos feitos por 11 fundos de pensão estatais em operações com títulos pós-fixados (remunerados com base na variação do IGPM e no IPCA): Previ, Petros, Funcef, Real Grandeza, Serpros, Portus, Eletros, Sistel, Centrus, Geap, Postalis. Quer saber quanto foi negociado, datas, preço unitário de compra e venda de títulos em comparação com as cotações de mercado no dia de cada negociação.

Pretende, também, a apuração das comissões pagas pelos fundos de pensão a bancos como Santos, Rural, BIC, BMC, BMG, Pine e Panamericano e corretoras como Arbor, Turfa, Quantia, CQRJ, Float, Arbor e Safic. Duas corretoras privadas terão seus negócios examinados à parte: a Assurê, do Rio, denunciada como beneficiária em contratos do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), e a Bônus-Banval, de São Paulo, que teria sido usada para sistemáticas transferências de dinheiro a integrantes do PT.