Título: INDÚSTRIA NA AVENIDA BRASIL PODE SER MAIS UMA INVADIDA
Autor: Carla Rocha, Leslie Leitão e Maria Elisa Alves
Fonte: O Globo, 09/08/2005, Rio, p. 14

Com o provável fechamento da Refinaria de Manguinhos, o destino do terreno de 560 mil metros quadrados à beira da Avenida Brasil pode ser o mesmo de outras indústrias da região: ser invadido por moradores de favelas próximas. Enquanto não dispensa os 500 funcionários ¿ a previsão é de que todos trabalhem até o próximo dia 19, quando poderão ser demitidos ¿ a direção da refinaria estuda como garantir a segurança do local e evitar que ele vire mais um retrato da decadência da região.

¿ Áreas industriais do Rio estão sendo substituídas por favelas, já que não há investimentos em habitação ¿ diz o economista Ib Teixeira.

Mas não é só a falta de política de habitação que tem transformado a área num deserto industrial. A violência vem causando a fuga de grandes empresas da região, que ficou conhecida como Faixa de Gaza e vai do Caju à Pavuna, incluindo as linhas Vermelha e Amarela, um trecho da Avenida Brasil e os complexos da Maré e do Alemão. Na área, um milhão de pessoas vivem em 33 bairros. Os investimentos públicos em infra-estrutura ¿ como iluminação, pavimentação, redes de drenagem, água e esgoto ¿ feitos na região são estimados entre R$3 bilhões e R$20 bilhões.

Apesar disso, o que chama mais a atenção atualmente são os exemplos de abandono. Um dos mais marcantes é o do Mercado São Sebastião, na Penha, onde foram fechados nos últimos anos cerca de mil galpões, metade do total. Lá, ruas e calçadas foram invadidas e já há barracos em frente a lojas desativadas. Uma barra de ferro, instalada pelo tráfico, marca o limite entre o mercado de gêneros alimentícios e a Favela Marcílio Dias. Há dez anos, passavam pelo local diariamente 50 mil pessoas. Hoje, só dez mil.

Em Benfica, invasores ocuparam o prédio da CCPL. Em Manguinhos, o da Conab; e, em Bonsucesso, o da Borgauto. Perto do Complexo do Alemão, cerca de 300 famílias invadiram o prédio da cervejaria Skol. Em abril de 2004, uma fábrica desativada da Poesi, também próxima ao Alemão, foi saqueada após quatro dias de incêndio. Durante uma semana, os invasores roubaram tudo que encontraram pela frente: rolos de tecido, esquadrias, lingerie e até uma cápsula radioativa, de um dos equipamentos da Poesi.

Na região próxima às avenidas Itararé e Itaoca, entre os morros do Adeus e do Alemão, para cada empresa aberta há pelo menos quatro fechadas. Uma pesquisa do Instituto Fecomércio-RJ mostra um percentual alto de imóveis fechados. Na Penha, 12,8% (290) dos 2.257 imóveis comerciais, industriais e residenciais estão desocupados. Em Olaria, o índice é de 8,68% (74 dos 1.464 imóveis). Com tantos exemplos de degradação, o economista Ib Teixeira diz não crer mais na recuperação da região:

¿ A violência gera abandono, que gera ocupação, que gera mais abandono dos vizinhos e assim continua a decadência da área.

Responsável por uma grande reforma na refinaria, após denunciar o uso de chumbo tetraetila em seu processo industrial, o deputado estadual Carlos Minc (PT) lembrou que a empresa é importante para o desenvolvimento do estado. Ele disse que, apesar disso, são muitos os casos de violência associados à refinaria.

¿ A área é pólvora pura, está colada à Favela de Manguinhos. Há algum tempo temos relatos de tiros dentro da refinaria e nas proximidades.

Vizinha à refinaria, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) está localizada entre favelas e tem enfrentado reveses: é comum balas perdidas atingirem o prédio, em forma de castelo:

¿ A Fiocruz virou uma ilha cercada de favelas por todos os lados ¿ lamenta Ib Teixeira.