Título: REMÉDIOS MAIS SEGUROS
Autor: GIUSEPPE REPETTO e MARIZA CORAL e WALMIR COUTINHO
Fonte: O Globo, 12/08/2005, Opinião, p. 7

AAgência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) está dando mais um passo para aprimorar o controle da produção de medicamentos no país. O órgão, que tem sido ativo defensor dos interesses dos consumidores, está agora na reta final para estabelecer uma nova regulamentação que delimita a atividade das farmácias de manipulação no mercado brasileiro.

A norma, ainda em fase de consulta pública, traz inovações consideráveis. Uma das medidas introduzidas pelo ¿Regulamento técnico sobre as boas práticas de manipulação de medicamentos¿ diz respeito à criação de diferentes grupos de atividades para as farmácias magistrais.

Outra medida introduzida pela Anvisa, e que está produzindo grande polêmica, restringe a manipulação apenas às formas farmacêuticas e a dosagens não atendidas por medicamentos industrializados. A conduta tem sua razão de ser. Os remédios produzidos pelas indústrias, antes de serem colocados à disposição de médicos e pacientes, são exaustivamente testados e submetidos a amplos ensaios clínicos, que muitas vezes consomem anos de trabalho científico.

Outro fator a ser destacado, em relação às farmácias de manipulação, é a possibilidade da formulação indiscriminada de medicamentos que contenham associação de diferentes substâncias. As possíveis interações medicamentosas, além de prejudicarem a correta absorção dos fármacos, podem aumentar a probabilidade de surgirem efeitos colaterais. Do ponto de vista médico, a manipulação de múltiplos princípios ativos associados pode causar efeitos terapêuticos desconhecidos, nocivos e, muitas vezes, inúteis.

O exemplo mais nefasto para a saúde dos pacientes é o das fórmulas para emagrecer que, em alguns estabelecimentos, estão disponíveis de forma totalmente irresponsável, por designações do tipo ¿Fórmula nº 2¿, que incluem uma série de substâncias que não têm indicação para o tratamento da obesidade. Freqüentemente são utilizados nessas fórmulas os hormônios tireoidianos, em doses altas, pondo em risco a vida dos pacientes que as utilizam. Estes hormônios só deveriam ser utilizados nos tratamentos de doenças da tireóide, nunca como parte de um tratamento para emagrecer. Sua dosagem deve ser muito precisa, em microgramas, enquanto a maioria dos medicamentos tem suas doses calculadas em miligramas.

Um levantamento recente por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) revelou uma altíssima prevalência de doenças tireoidianas na população carioca, associada justamente a uso freqüente de fórmulas para emagrecer. É por isso que condenamos o uso desses hormônios nas fórmulas magistrais.

Em relação à segurança no uso de fármacos pelos pacientes, é importante destacar também que os medicamentos produzidos pela indústria farmacêutica descrevem, em bula, todos os componentes de sua fórmula. Já o medicamento manipulado, na maioria dos casos, não é dispensado com a bula para contra-indicar, advertir e orientar os usuários.

Além disso, a farmacovigilância é uma prática habitual das indústrias farmacêuticas. Todos os dados sobre efeitos adversos são coletados, incluídos em documentações oficiais e periodicamente encaminhados às agências de vigilância sanitária. O mesmo não acontece com as farmácias de manipulação. Dificilmente se podem detectar e organizar os dados referentes a efeitos adversos em pacientes que usam medicamentos manipulados.

A Anvisa atua na fiscalização dos medicamentos industrializados a fim de atingir um objetivo maior: oferecer qualidade e segurança para todos os remédios comercializados no país. Por questão de escala, as indústrias farmacêuticas foram e são o alvo primário dessa evolução regulatória promovida pela Anvisa, tendo que se adequar aos mais rigorosos padrões técnicos e cumpri-los, inspirados em critérios internacionais na produção e comercialização de medicamentos de qualidade.

Agora, estamos diante desta nova etapa, a de regular o trabalho das farmácias de manipulação, visando a um novo patamar de controle sanitário e de respeito à saúde da população.

GIUSEPPE REPETTO é presidente da Associação Brasileira para Estudo da Obesidade; MARIZA CORAL é presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia; e WALMIR COUTINHO é vice-presidente da Federation of Latin American Societies of Obesity.