Título: GOVERNO QUER RESTRINGIR ENTRADA DE 46 PRODUTOS
Autor: Eliane Oliveira
Fonte: O Globo, 13/08/2005, Economia, p. 36

BC pode exigir pagamento à vista na importação de brinquedos, arroz e vinho, o que afetaria China e Argentina

BRASÍLIA. O governo está a um passo de tomar uma medida extrema para proteger alguns setores brasileiros das importações de países de dentro e fora do Mercosul. Está em análise pelo Banco Central (BC) uma lista com 46 itens - entre os quais calçados, brinquedos, arroz, vinhos, tecidos, artigos de vestuário em geral, eletrodomésticos e eletroeletrônicos - que só poderão entrar no Brasil se os importadores pagarem à vista pelos produtos. Entre os mercados que deverão ser mais atingidos destacam-se China e Argentina.

Já está pronto o esboço de uma circular do BC, discutida quinta-feira na Câmara de Comércio Exterior (Camex). Embora o governo garanta que a medida não se trata de uma retaliação à Argentina, coincidentemente o principal parceiro do Mercosul adotou o mesmo procedimento, publicando uma lista de nada menos que 1.800 itens, com destaque para calçados, têxteis, eletrodomésticos, automóveis, papel, café e frutas tropicais. Todos esses produtos têm grande peso na pauta de exportações brasileiras para o vizinho.

Medida reduziria volume de dólares no mercado

Além da Argentina, o Uruguai será atingido se a medida for realmente efetivada. O país é um grande produtor de arroz, incluído na lista para atender aos rizicultores, que reclamam de queda na renda alegando que os preços despencaram devido à invasão do produto do Mercosul. A relação também contém misturas e pastas para preparação de produtos de padaria - alcançando indiretamente o trigo e a farinha de trigo - e vinhos. Os vinicultores brasileiros tentam fechar um acordo com os argentinos, alegando dumping. Mas até agora não houve entendimento.

A última vez que o Brasil adotou uma medida do gênero foi em 1997. Devido a protestos do então presidente argentino Carlos Menem, o governo brasileiro excluiu da exigência de pagamento à vista os sócios do Mercosul. Mas manteve a restrição para importações do bloco acima de US$40 mil.

Os argumentos favoráveis à medida são também semelhantes aos usados pelo presidente Néstor Kirchner no mês passado, quando divulgou a lista de 1.800 itens. Para técnicos do governo brasileiro, ao pagarem pelos produtos à vista, os importadores vão retirar dólares do mercado interno e ajudarão a evitar que a moeda americana continue se desvalorizando de forma substancial.

No caso da China - e outros países asiáticos, em escala menor - ao baixar a circular o governo estará atendendo a um conjunto de setores que há meses pedem providências para se protegerem dos importados. Isso porque da lista constam produtos de ponta nas vendas chinesas, como vidro, calçados, brinquedos, eletrodomésticos, eletroeletrônicos, fibras artificiais, filamentos sintéticos, tecidos de malha, lanternas, armações para óculos e até instrumentos musicais.

Outro passo do governo para proteger as indústrias nacionais das importações da China consiste na publicação de dois decretos permitindo a adoção de salvaguardas específicas para as compras de produtos chineses. Pelas regras atuais, o país só pode aplicar sobretaxas ou cotas, como salvaguardas, se for para todos os mercados, sem exceção. No entanto, quando a China se associou à Organização Mundial do Comércio (OMC), teve de aceitar dos demais membros do organismo a possibilidade de a medida ser aplicada.

Um dos decretos a ser publicado atinge somente o setor têxtil e de vestuário. O outro decreto afeta os demais produtos. Mas a salvaguarda só pode ser adotada se o segmento industrial brasileiro que estiver se sentindo prejudicado comprovar que sofreu danos decorrentes das importações - um procedimento que leva tempo.

INCLUI QUADRO: CONHEÇA OS PRINCIPAIS ÍTENS DA LISTA