Título: Tese de campanha não é verdadeira
Autor: Eduardo Paes
Fonte: O Globo, 14/08/2005, O País, p. 4

Eduardo Paes duvida dos empréstimos dados por BMG e Rural a Valério

Um dos mais assíduos freqüentadores do porão, apelido dado ao subsolo do prédio do Senado onde ficam guardados os documentos da CPI dos Correios, o vice-líder do PSDB na Câmara, Eduardo Paes (RJ), duvida da veracidade dos empréstimos dados pelos bancos BMG e Rural ao empresário Marcos Valério, responsável pelos pagamentos a políticos da base aliada e do PT. Na semana em que seu partido, além de atirar pedras no governo, teve de proteger a vidraça que se tornou o empréstimo feito pelo mesmo empresário para a campanha do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), durante a disputa de 1998 pelo governo mineiro, Paes disse que as duas operações são delituosas. Ele acha, entretanto, que não se pode usar uma operação feita no período eleitoral, a dos tucanos, para desviar o foco das denúncias de corrupção no governo federal.

Os integrantes da CPI estão convencidos da veracidade dos empréstimos tomados por Marcos Valério?

EDUARDO PAES: Todos na CPI têm uma profunda desconfiança da veracidade destes empréstimos. É muito estranho que qualquer pessoa, mesmo que fosse participante de um grande esquema escuso, com os juros que o Brasil tem, fosse fazer empréstimos sem se preocupar em quitá-los. Os valores atualizados hoje chegam a quase R$100 milhões. Como é que eles iam pagar este empréstimo? Mesmo que fosse com dinheiro fruto de corrupção, não é uma medida muito inteligente roubar para pagar juros em banco.

Os empréstimos serviriam para justificar a tese de que foi cometido apenas um crime eleitoral? Afinal, com eles o dinheiro teria uma origem.

PAES: Temos de desmontar essa tese de que isso era recurso para campanha eleitoral. O período dos empréstimos é completamente distinto do período eleitoral. Acreditar nesta tese é a mesma coisa que legitimar a corrupção no Brasil. Agora todo político que levou dinheiro vai dizer que era para campanha eleitoral. Mas a legislação limita o período do processo eleitoral legal, que dura do momento em que você abre a conta bancária da campanha até a aprovação das suas contas. Portanto, essa tese de que esse dinheiro é para campanha eleitoral não é verdadeira.

E como o senhor vê a relação de Valério com o PSDB mineiro na campanha de 1998?

PAES: Esse é um caso relevante, que merece explicações e o senador Eduardo Azeredo tem se esforçado para isso. O PSDB não defende que isso não seja investigado e levantado. Mas a questão é que trazer isso para a CPI é uma forma de desviar o foco de um esquema de corrupção montado no governo federal, que não tem só os empréstimos. Tem corrupção em contratos, interesses de empresas privadas sendo atendidos dentro do governo com o dinheiro e sendo esquentado pela agência de publicidade.

Mas a sua tese de que não é crime eleitoral vale também para a campanha tucana de 1998 em Minas Gerais?

PAES: Estão tentando desviar o foco (do governo federal), porque ali (em Minas Gerais) pode se caracterizar como empréstimo eleitoral. Foi dentro do período eleitoral, feito pelo candidato a vice-governador (Clésio Andrade), que era o dono de fato da empresa tomadora do empréstimo. E as garantias dadas não foram contratos dados pelo governo. Os contratos usados eram de 1999, quando Azeredo não era mais governador. As duas situações são delituosas, fora da lei, mas uma é um delito eleitoral e a outra é um esquema de corrupção.

E que outros problemas a CPI já encontrou nos pagamentos feitos por Valério a pedido do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares?

PAES: O que comprova essa tese de que o dinheiro não era de campanha é uma falha na montagem da estratégia deles. Foi feito o pagamento do advogado Aristides Junqueira, que já confirmou que recebeu os recursos referentes a honorários pagos pelo serviço de defender o PT no escândalo de Santo André. É a primeira vez que se monta um escândalo para arrumar recursos para se defender em outro escândalo.

E quais são as irregularidades encontradas nos contratos das agências de Valério com o governo?

PAES: Valério, ao terceirizar serviços de publicidade com o Banco do Brasil, por exemplo, superfaturava esses serviços. Cobrava um valor maior do que ele repassava. Contratava empresas de forma fraudulenta que pertenciam a ele mesmo. Ele fazia um ganho duplo faturava a maior e ainda repassava o negócio para uma empresa dele mesmo. Existem ainda elementos que mostram que a licitação que ele venceu nos Correios foi direcionada pela Secretaria de Comunicação.