Título: PEQUENOS SEM GÁS PARA EXPORTAR
Autor: Eliane Oliveira
Fonte: O Globo, 15/08/2005, Economia, p. 12

Real valorizado fez 670 empresas de menor porte desistirem do mercado internacional

Arobustez da balança comercial brasileira ¿ no primeiro semestre o comércio exterior brasileiro registrou um superávit de US$15,6 bilhões, colecionando recordes ¿ esconde o impacto diferenciado do câmbio apreciado no mercado exportador do país. Enquanto as grandes empresas têm poder de fogo e mantêm o fôlego independentemente da valorização do real frente ao dólar e ao euro, as firmas pequenas e médias sofrem para continuar competitivas no mercado internacional devido à queda de rentabilidade, e, em diversos casos, são obrigadas a abrir mão das exportações.

De acordo com as estatísticas do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, o número de grandes empresas exportadoras continuou crescendo de janeiro a junho deste ano, frente ao primeiro semestre de 2004. Todavia, o total de firmas que venderam até US$60 mil ao exterior nos seis primeiros meses do ano caiu de 6.755 em 2004 para 6.085 em 2005. Ou seja, foram 670 empresas a menos, uma queda de 9,92%. Entre aquelas com exportações de até US$20 mil, deixaram o comércio exterior 277 firmas (de 2.139 para 1.862, em comparação ao primeiro semestre de 2004).

Quem não conseguiu resistir às dificuldades sabe que será ainda mais árduo o caminho de volta. É o caso do pequeno empresário do setor do vestuário Luiz Carlos Guimarães, que desistiu do projeto de exportação, porque vendia no ano passado a R$2,90 e de repente viu o câmbio despencar para R$2,30. Ganhava menos em reais, por conta das exportações mais baratas, e ainda enfrentava a concorrência dos importados, porque é mais fácil importar com o dólar baixo.

¿ Tive de mandar 35 empregados embora ¿ lamenta ele.

Por enquanto, Guimarães só mantém as remessas de roupas para sua loja em Miami.

¿ Sei que quem sai dificilmente volta. Mas vou tentar, quando as coisas melhorarem ¿ diz ele, que vendia seus produtos para os Estados Unidos e a Itália e teve de segurar as pontas até maio último, quando venceu o último contrato.

Na quinta-feira passada, a empresária Fabiane Rossi fez uma reunião com seu pessoal sobre os custos com a exportação de equipamentos para automatização de portões. A decisão será tomada esta semana, mas ela antecipa que a tendência é a firma deixar de lado as vendas externas.

¿ Nossa tabela em dólar estava baseada em R$2,70. Hoje, recebemos por R$2,23. As coisas já começaram a ficar complicadas e estouraram nossos limites. E não podemos sequer dizer a nossos clientes que queremos reajustar os preços, porque eles reclamam ¿ conta Fabiane, que tem como clientes mexicanos, africanos e panamenhos.

¿ Nosso faturamento cai conforme cai o dólar ¿ responde ela, ao ser perguntada sobre quanto perdeu nos últimos meses.

Exportação de flores deve ter queda de 50%

O Ministério do Desenvolvimento está analisando as razões da queda, tendo em vista que, historicamente, o número subia. Uma possibilidade que não pode ser descartada, lembram os técnicos, é que algumas empresas mudaram a classificação, passando para uma faixa superior em termos de valor exportado, o que reduziria o universo de pequenas empresas. No entanto, para a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), o motivo é claro: as companhias pequenas e médias estão sendo fortemente prejudicadas pela valorização do real.

¿ Essas categorias de exportadores não têm o mesmo fôlego das grandes empresas ¿ afirma o vice-presidente da AEB, José Augusto de Castro.

Ele destaca que, por valor exportado, o número de firmas que venderam abaixo de US$60 mil no primeiro semestre diminuiu em todas as faixas. Entre as empresas que exportaram até US$1 mil no primeiro semestre, o número caiu de 268 para 180; nas companhias com até US$2 mil, a queda foi de 366 para 278; e entre US$10 mil e US$20 mil, de 1.505 mil para 1.404 mil. O número de empresas maiores, porém, aumentou, mesmo que com pequenos acréscimos, sua participação. As que venderam acima de US$100 milhões, por exemplo, subiram de 71 para 94 e as que ficam na faixa de US$20 milhões a US$40 milhões, de 138 para 183.

O presidente da Associação dos Produtores de Flores Tropicais do Estado de Alagoas, Alonso Lamas, afirma que a previsão é de que as exportações de várias empresas de seu segmento despenquem 50%. O Brasil vende cerca de 50 variedades de flores tropicais, principalmente para a Europa.

¿ Todos estão desanimados ¿ confirma Valdete Daniel de Moura, produtora de flores em Maceió.

Há alguns segmentos que, por sua vez, gostariam que o dólar continuasse como está. É o caso das indústrias da informação.

¿ Nesse setor da tecnologia da informação, o câmbio não influencia muito, porque grande parte dos produtos é importada. Não estamos sendo muito afetados por isso ¿ explica Antonio Fabio Ribeiro, presidente do Sindicato das Indústrias de Informação do Distrito Federal.