Título: BB AGORA SE PREPARA PARA CALOTE DO PT
Autor: Enio Vieira
Fonte: O Globo, 16/08/2005, O País, p. 3

Banco já admite que não deverá receber parte da dívida de R$27 milhões

BRASÍLIA. O Banco do Brasil (BB) já se prepara para um possível calote do Partido dos Trabalhadores. Com a vulnerabilidade das contas do PT exposta por denúncias de caixa dois, o banco decidiu aumentar a provisão para cobrir possíveis perdas nos dois financiamentos que mantém com o partido. A provisão é uma espécie de reserva que uma empresa faz para um crédito que acha difícil receber ¿ e, no balanço financeiro, é lançada como passivo.

Ontem, o vice-presidente de Crédito e Risco Global do BB, Adézio Lima, informou que o partido está em dia com os pagamentos, mas o banco avaliou que subiu o risco das operações após as informações sobre as dificuldades financeiras reconhecidas pelo PT. Na semana passada, o conselho do BB também decidiu que o banco não vai mais trabalhar com operações de crédito para partidos políticos, instituições religiosas (igrejas), sindicatos e clubes esportivos.

A primeira operação do BB com o PT é o empréstimo de R$3 milhões na modalidade chamada conta garantida, que é um cheque especial para pessoas jurídicas. O financiamento passou a ter uma provisão de 100% do valor total, feita com recursos da própria instituição financeira. No caso de um calote dos petistas, o Banco do Brasil não precisará então registrar a perda como prejuízo. Se o crédito for pago normalmente, a provisão será anulada e contabilizada como receita. Antes a reserva deste crédito era de 10% do valor da operação.

Presidente do banco diz que legalidade das operações não foi contestada

Outro empréstimo é o leasing de R$24 milhões, feito no início de 2004, para compra de computadores. O BB tinha uma provisão de 1% do valor e aumentou para 30%.

¿ O PT já pagou um terço deste valor. O leasing é um aluguel de equipamentos, no caso os computadores, que pertencem ao banco e têm a garantia do fundo partidário do PT. Houve informações novas no mercado e decidimos aumentar a provisão ¿ disse Lima.

O presidente do BB, Rossano Maranhão, afirmou que o PT se tornou cliente da instituição em 1999 e não existe até agora questionamento da legalidade das operações já realizadas. O que mudou foi a análise de risco com as declarações públicas de que o partido está em dificuldade financeira.

Segundo ele, o leasing do PT foi avaliado pelo Tribunal de Contas da União (TCU). A única observação teria sido o descompasso de cronograma entre os vencimentos das parcelas a serem pagas no leasing e na liberação do fundo partidário na hipótese de inadimplência. Neste caso, o risco é que a instituição financeira não consiga receber os recursos de imediato do fundo partidário.

¿ Não há suspeição em nenhuma área do banco. O que existe é o problema na área de publicidade, mas temos 38 auditores fazendo uma devassa ¿ disse Maranhão.

No mês passado, surgiram denúncias de envolvimento do então diretor de Marketing do BB, Henrique Pizzolato, com o esquema de Marcos Valério. Sob pressão, Pizzolato saiu do cargo e pediu aposentadoria antecipada no banco, pois era funcionário de carreira. A CPI dos Correios deverá ouvi-lo esta semana.

Maranhão, que ontem anunciou o lucro de R$1,979 bilhão do banco no primeiro semestre, disse que a auditoria na área de marketing começou em 15 de julho e deve acabar dentro de 30 dias. Dez funcionários do setor de publicidade do BB foram afastados, com perda de comissão nos salários, para tornar mais segura a investigação. Há 14 auditores na empresa Cobra, subsidiária de informática, e dez no Banco Popular do Brasil (BPB), braço do BB para o atendimento à população mais pobre. Segundo Maranhão, o presidente do BPB, Geraldo Magela, deve deixar o cargo em até duas semanas para disputar as eleições no Distrito Federal.

Em novembro de 2004, o BPB abriu 270 mil contas usando o cadastro da Marabraz, uma rede de lojas de móveis para baixa renda em São Paulo. A subsidiária do BB tentou fechar parceria com a rede, mas o acordo foi cancelado. Mesmo assim, os clientes foram registrados no banco para atingir a meta de um milhão de contas para microcrédito.

Atos que não tenham conexão com trabalho do BB serão levados ao MP

Quem presidia a instituição era Ivan Guimarães, que era próximo do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e apareceu como intermediário na venda do apartamento de uma das ex-mulheres do ex-ministro e deputado José Dirceu (PT-SP).

¿ Qualquer ato apurado na auditoria e que não tenha conexão com os trabalhos do banco será levado para o Ministério Público ¿ prometeu Maranhão.

Outra auditoria em andamento analisa o acordo de compra de ações da Brasil Telecom pela Previ, o fundo de pensão de funcionários do BB. Segundo o presidente do BB, o conselho diretor da Previ solicitou auditoria para detalhar a operação, que será levada à cúpula do banco. A operação é um acordo que dá preferência à Previ e a outros fundos de pensão para comprar as ações na empresa de telefonia que pertencem ao Citigroup. Essas participações eram administradas pelo Opportunity, do banqueiro Daniel Dantas, que mantém uma complexa disputa judicial com o Citigroup e a Previ. Os fundos de pensão já tornaram público o contrato e dizem que ele segue padrões de mercado. As negociações com os fundos também estão sob investigação da CPI dos Correios. Ontem, os dirigentes de Previ, Petros (Petrobras) e Funcef (Caixa Econômica Federal) se prontificaram a comparecer à CPI para prestar informações.