Título: Sarney defende Lula e reforma de emergência
Autor: Lydia Medeiros
Fonte: O Globo, 17/08/2005, O País, p. 14

Ex-presidente faz discurso no Senado contra o impeachment e propõe um 'presidencialismo moderado'

BRASÍLIA. Depois de 90 dias de silêncio, o senador José Sarney (PMDB-AP) fez ontem sua primeira manifestação pública sobre a crise política com um discurso no plenário. Defendeu o mandato do presidente Lula de forma contundente e rejeitou o impeachment; pregou a necessidade de investigações profundas e punições exemplares para os casos de corrupção; e propôs uma reforma política de emergência para mudar as regras das próximas eleições.

- O presidente Lula é o símbolo e a razão de um grande avanço institucional e político do Brasil. Sob nenhuma hipótese este processo pode ser apagado. Não há caminhos de volta na História - discursou.

Sarney listou oito medidas, a maioria delas para as eleições de 2006. A mais polêmica é a adoção de um modelo que chamou de presidencialismo moderado. A idéia é que, além do chefe de Estado, que cuidaria dos assuntos de defesa e relações exteriores, o país tenha um chefe de governo nomeado pelo presidente da República. Esse primeiro-ministro seria escolhido sem necessidade da aprovação do Legislativo. Mas poderia ser destituído pelo voto de dois terços dos congressistas.

- Com essa solução, nas horas de crise teremos uma barreira que protegerá o presidente e evitará que as instituições sejam atingidas - justificou o ex-presidente.

O senador afirmou que a eleição de Lula foi um marco "que coloca as camadas de base do povo no poder sem uma revolução".

- Não há na conduta do presidente Lula nada que nem de leve possa atingir seu mandato. Nenhum crime de responsabilidade. Ele está pagando pelos erros de seu partido - disse.

Para Sarney, esquerda é equilibrada e responsável

Sarney elogiou a oposição, por decidir não buscar "expulsar o presidente", mas criticou a tentativa de estender os erros dos dirigentes partidários no poder a toda a esquerda brasileira. Para Sarney, a esquerda que ascendeu ao poder com Lula é equilibrada e responsável. Sem citar as palavras golpe e elite, Sarney disse que a esquerda custou a conquistar espaços e não se pode pensar em bani-la da vida política por causa da falta de caráter e valores morais de algumas pessoas.

Apesar dos aplausos, o discurso de Sarney em defesa de Lula - que não permitiu apartes - foi duramente contestado em pronunciamentos posteriores, começando pelo tucano Tasso Jereissati (CE).

- Nenhuma história bonita justifica a corrupção, a má-fé e a desilusão que se espalharam neste país. A História não dá impunidade a ninguém - disse Tasso.

Para Sarney, a reforma política de transição teria de acabar com os showmícios, para baratear custos eleitorais, instituir o voto em listas partidárias e o financiamento público das campanhas. Ele sustentou ainda que as medidas provisórias só deveriam ser usadas para tratar de assuntos financeiros, calamidades públicas e segurança nacional. Para Sarney, por outro lado, o Legislativo não deveria mais ter competência para opinar sobre a organização administrativa.

Legenda da foto: JOSÉ SARNEY: discurso no Senado pregando a punição de corruptos