Título: Campanhas chatas, escolhas insensatas
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 19/08/2005, O Globo, p. 2

Mais uma vez o autoritarismo perpassa o projeto aprovado ontem pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado com o objetivo de baratear as campanhas eleitorais. De autoria do senador Jorge Bornhausen (PFL-SC), foi aprovado em versão modificada pelo relator José Jorge (PFL-PE). Algumas das propostas trarão resultados mas o retorno dos programas eleitorais no formato semelhante ao imposto pela Lei Falcão será uma restrição à liberdade de expressão dos candidatos, com poucos ganhos sobre o custo de produção.

Ao determinar que os programas de televisão usem apenas imagens de estúdio, deles podendo participar apenas os candidatos e os filiados ao partido, ficando proibidas as cenas externas e outros recursos técnicos, o projeto intencionalmente progressista de um partido liberal torna-se autoritário e reacionário. Com sua Lei Falcão, a ditadura permitia apenas a leitura da biografia do candidato com a exibição de sua fotografia e seu número. A nova proposta não chega a emudecer os candidatos mas passa a exigir que se expressem apenas pela boca, num tempo em que as imagens valem muito mais que as palavras. Ficam eles proibidos de usar outros recursos de linguagem que, melhorando a qualidade dos programas, contribuem para elevar o nível de compreensão dos eleitores. Ficam proibidas, além das cenas externas, montagens ou trucagens, computação gráfica, desenhos animados, efeitos especiais e conversão para vídeo de imagens cinematográficas. O candidato que burlar a lei ficará fora do ar por dez dias.

Ademais, segundo profissionais de publicidade e marketing político, isso pouco influirá no custo global de um projeto de estratégia eleitoral, produto de valor altamente complexo. Estarão sendo cortados apenas os custos de produção material mas é possível que os criadores tenham até que cobrar para trabalhar sob tamanhas restrições à expressão.

Em tais condições, levarão vantagem os demagogos, os promesseiros e outros falastrões, que não poderão ser desmentidos com imagens e depoimentos de pessoas não filiadas ao partido. O PT, por sinal, está concordando por conveniência com esta proposta. No ano que vem, ninguém poderá exibir imagens das CPIs, de Valério ou Delúbio abusando de nossa paciência, de presos com cuecas recheadas de dinheiro.

Insossos, verborrágicos e aborrecidos, os programas eleitorais convidarão o eleitor a desligar a televisão, em prejuízo do discernimento na hora de votar.

Outras medidas do projeto podem, sim, contribuir para o barateamento: a redução do tempo de campanha eletrônica (de 45 para 35 dias), a proibição de showmícios e de distribuição de brindes como as camisetas e os bonés. A limitação do valor das doações legais, por sua vez, não acabará com o caixa-dois, mas é positiva a adoção de punições mais severas para os crimes eleitorais. Boa também a proibição da divulgação de pesquisas nos 15 dias que antecedem os pleitos. Se não houver recurso ao plenário, o projeto vai agora para a Câmara.