Título: Auditoria mostra interferência da Secom em contratos de publicidade
Autor: Regina Alvarez
Fonte: O Globo, 21/08/2005, O País, p. 4

Tribunal de Contas da União investigou gestão do ex-ministro Luiz Gushiken

BRASÍLIA. Resultados preliminares de uma mega-auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) nos contratos de publicidade do governo mostram a forte interferência da Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica (Secom) nas licitações e na execução desses serviços na gestão do ex-ministro Luiz Gushiken. As irregularidades nos contratos nessa área não se restringem aos órgãos atendidos pela DNA Propaganda e pela SMP&B, agências do empresário Marcos Valério. Os auditores já identificaram problemas nos contratos com a Presidência da República, com o Ministério da Cultura e com bancos estatais, atendidos por outras agências.

O presidente do TCU, Adylson Mota, prevê que o resultado final da auditoria, previsto para 30 de setembro, pode levar ao cancelamento de diversos contratos no governo e estatais e exigirá uma nova política para essa área.

¿ A área de publicidade tem um componente extremamente subjetivo, que é a criatividade, mas já é possível concluir que há uma falta de fiscalização generalizada na execução desses contratos ¿ afirma Mota.

Secom interferia na licitação via membros de comissões

Uma das conclusões dos auditores é que a Secom influenciava as licitações nessa área, através da indicação da maioria dos membros nas comissões de licitação. No caso da administração direta, a Secom chamou para si a decisão sobre os gastos das campanhas publicitárias. Um dos ministérios ouvidos pela auditoria informou que não tinha qualquer autonomia para negociar preços com fornecedores, cabendo esse papel à Secom.

No contrato da SMP&B com os Correios, os auditores encontraram casos de repasse de recursos para emissoras de rádio em valores abaixo dos declarados nas notas fiscais. Essa diferença entre valores das notas fiscais e os efetivamente repassados para fornecedores também foi identificada no Banco do Brasil, que tinha contrato com a DNA Propaganda. Na Eletronorte, outra estatal atendida pela DNA, os auditores constataram que para alguns serviços terceirizados não foram apresentadas as três propostas de preços, como determina a legislação.

O que chamou mais a atenção nos serviços terceirizados pelas agências foi a evidência de que, em muitos casos, os orçamentos foram combinados ou forjados. No Ministério da Cultura, os auditores do TCU encontraram três orçamentos encaminhados por empresas diferentes de um mesmo número de fax. Na Presidência da República, há um caso em que as três empresas que apresentaram orçamentos funcionam no mesmo endereço.

¿ Concluímos que nesses casos apenas um orçamento é real e os outros dois são frios, forjados. A empresa escolhida para realizar o serviço se encarrega de providenciar os outros dois orçamentos ¿ explica o presidente do TCU.

Outra ocorrência identificada pelos auditores é o que eles chamam de ¿barriga de aluguel¿. A agência que ganhou a licitação repassa integralmente os serviços para terceiros, inclusive a parte de criação, e o pagamento é rateado entre a contratada e os executores do serviço. Essa prática foi encontrada no Ministério da Cultura e no BNDES, entre outros órgãos do governo.

No BNDES também foram identificados serviços realizados pelas agências DPZ e Contemporânea fora do objeto do contrato. A assessoria do banco informou que os serviços de criação são feitos pelas agências contratadas e garantiu que todos os serviços estão previstos no contrato.

No Ministério dos Esportes, que é atendido pela SMP&B, foram encontradas irregularidades em notas fiscais, falta de comprovação de serviços e a subcontratação da MultiAction, outra empresa de Marcos Valério, para serviços não especificados com clareza. No Banco da Amazônia (Basa), os auditores estranharam a existência de um contrato de publicidade sem valor definido.

Nessa mega-auditoria, que conta com 114 técnicos, o TCU trabalha em parceria com o Ministério Público da União, outros órgãos do governo e a CPI dos Correios. Com isso, tem acesso ao sigilo bancário e fiscal de algumas empresas, no caso, as agências do empresário Marcos Valério. Mas para o ministro Adylson Mota seria necessário modificar as leis do sigilo, para que o Tribunal pudesse ter acesso permanente a essas informações e não apenas em momentos de crise. Um projeto nesse sentido já tramita no Congresso.

¿ Trabalhar de forma integrada e a troca de informações é fundamental para a fiscalização, já que o objetivo de todos é proteger o Estado e preservar o erário ¿ afirma Mota.

O procurador-geral do Ministério Público junto ao TCU, Lucas Furtado, espera que o resultado da auditoria e a identificação das irregularidades contribuam para ampliar a fiscalização nessa área.

¿ O escândalo do TRT de São Paulo resultou em grandes avanços na fiscalização das obras no setor público. Esperamos que na área de publicidade aconteça o mesmo.