Título: CONDUTA DE PROMOTOR CAUSA POLÊMICA
Autor: Adauri Antunes Barbosa
Fonte: O Globo, 23/08/2005, O País, p. 8

Profissionais de direito vêem excesso; dirigentes de classe evocam transparência

A atitude do promotor Sebastião Sérgio da Silveira, que divulgou trechos do depoimento de Rogério Buratti com acusações ao ministro da Fazenda, Antonio Palocci, abriu um debate nos meios jurídicos sobre os limites da atuação do Ministério Público (MP). A maioria dos profissionais de direito consultados pelo GLOBO criticou a conduta de Silveira, mas os dirigentes de classe do MP ponderaram que é preciso garantir o princípio da transparência dos atos jurídicos.

O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Roberto Busato, considerou a conduta do promotor ¿uma irresponsabilidade¿ e disse que ela está ¿definitivamente fora do ordenamento legal¿. Busato explicou que, numa investigação, os fatos a ela relacionados devem ser examinados e comprovados antes de serem levados a público.

¿ Investigação não é show. A OAB vem exigindo já há muito tempo das autoridades policiais e do próprio Ministério Público o respeito ao ordenamento jurídico. As declarações vazadas em meio a um interrogatório, por parte de um membro do Ministério Público, acabaram trazendo convulsão econômica no país ¿ lamentou o presidente da OAB.

Associação diz que MP tem de defender sociedade

Para José Carlos Cosenzo, vice-presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), a primeira missão do MP é a defesa da sociedade, razão pela qual ele concordou com a atitude do colega em Ribeirão Preto.

¿ Não estamos em defesa de Palocci ou de alguém em especial. Temos de defender a sociedade e ela é que vai julgar os atos do MP. Como é que o MP iria ocultar o fato? Eles (os promotores que cobrem o caso) estão fazendo um trabalho neste sentido há mais de cinco anos. Ninguém foi irresponsável. Eles sabem o que estão fazendo. Não há segredo de Justiça. É preciso dar satisfação à sociedade. Nossa linha é a mesma do povo.

O advogado Sérgio Bermudes disse que, do ponto de vista legal, se o processo não corre em segredo de Justiça, não há impedimento para a divulgação do depoimento. Porém, do ponto de vista ético, Bermudes reconhece que a conduta do promotor provocou um problema grave para a reputação das pessoas envolvidas:

¿ Uma reputação atingida dificilmente é recomposta.

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, Nicolao Dino, sustenta que a situação de Ribeirão Preto opôs valores fundamentais: o acesso à informação relativa a atos da vida pública, de um lado, e o direito à privacidade e à presunção de inocência, além do interesse no sucesso do trabalho de investigação, do outro.

¿ Neste caso, o promotor precisa ter prudência para preservar todos os interesses. A prevalência de um destes interesses não pode subjugar o outro valor. Daí, a necessidade de se encontrar um ponto de equilíbrio entre todos.

O advogado constitucionalista Luís Roberto Barroso disse que a proximidade entre o MP e a imprensa é, em certas situações, a única forma de desobstruir os canais institucionais de apuração e punição, quando estes foram capturados pelo poder político:

¿ Mas quando, diversamente, o Ministério Público se vale da imprensa não para vencer a inércia das instituições competentes, mas para fins diversos, como a promoção individual, a interferência direcionada no cenário político ou a perseguição a adversários, descumpre o seu papel e desperdiça o capital político que conquistou sob a Constituição.

Para José Carlos Cosenzo, da Conamp, se o governo brasileiro estivesse imbuído de preservar os interesses, ele próprio poderia ter pedido o segredo de Justiça:

¿ Dentro dos atos judiciais, o primeiro deles é a transparência. É algo inimaginável que ele tenha feito isso com interesse de prejudicar o ministro ou o governo. Promotor é um agente político.