Título: PAPA REÚNE UM MILHÃO DE FIÉIS E PEDE QUE VEJAM A `OUTRA ALEMANHA¿
Autor: Graça Magalhaes Ruether
Fonte: O Globo, 22/08/2005, O Mundo, p. 16

Bento XVI fala de passado nazista, mas ressalta que o país mudou

COLÔNIA, Alemanha. Pouco antes de voltar a Roma ao final de sua primeira viagem ao exterior, o Papa Bento XVI disse ontem esperar que a visita de quatro dias à sua terra natal tenha mostrado ao mundo ¿a outra Alemanha¿ de recursos espirituais e culturais, em contraste com seu vergonhoso passado nazista.

Na presença do presidente Horst Koehler, que foi ao aeroporto, o ex-cardeal Joseph Ratzinger ressaltou a nova Alemanha do pós-guerra.

¿ Nós estamos todos cientes do mal que emergiu de nossa terra natal durante o século XX, e reconhecemos isso com vergonha e sofrimento ¿ disse ele. ¿ Durante estes dias, graças a Deus, ficou mais do que evidente que há uma outra Alemanha, uma terra de recursos humanos, culturais e espirituais singulares.

Antes, numa missa dos superlativos, assistida por um milhão de pessoas de cerca de 200 países, o Papa encerrou a XX Jornada Mundial da Juventude, um evento por ele considerado ¿um boom de religiosidade¿, embora ainda exista um ¿esquecimento de Deus¿ em grande parte do mundo.

Acompanhado por 800 bispos e dez mil padres do mundo inteiro, ele disse que só ¿com a explosão do bem¿ seria possível melhorar o mundo¿.

¿ Só dessa explosão interna do bem, que supera o mal, pode sair a cadeia de metamorfose que progressivamente modela o mundo ¿ disse o Pontífice, em missa assistida pelo chanceler federal Gerhard Schroeder e pelo presidente Horst Koehler, ambos protestantes.

Segundo analistas, o Papa acertou ao fazer seus primeiros pronunciamentos na Alemanha com enorme cautela e, ao mesmo tempo, de forma convincente. Mesmo teólogos críticos, que antes o chamavam ¿inquisidor do Vaticano¿, como Hans Küng, passaram a vê-lo com mais confiança.

¿ Ele assumiu com timidez a herança de João Paulo II, mas com confiança. Ele reagiu com timidez, porque João Paulo II tinha um carisma em relação ao qual nenhum sucessor gostaria de ser medido. Por outro lado, tinha a confiança da crença em Deus ¿ disse o padre Eberhard von Gemmingen, diretor do serviço alemão da Rádio Vaticano.

Cardeais alemães críticos, que antes exigiam posições mais liberais da Igreja, ficaram impressionados com a abordagem bem-sucedida do Pontífice. Segundo o cardeal Karl Lehmann, presidente da Conferência dos Bispos da Alemanha, com a visita à sinagoga de Colônia, o Papa mostrou uma grande sensibilidade para com ¿o sofrimento dos judeus nos últimos séculos e deu um sinal positivo ao pregar a aproximação das duas religiões¿. Também a sua tentativa de aproximação com ortodoxos, protestantes e muçulmanos foi elogiada.

O Papa, de 78 anos, não demonstrou sinais de cansaço, apesar da programação intensa. A missa, de três horas de duração, foi celebrada no alto de uma colina. O avião de volta à Itália foi pilotado por Martin Ott, ex-aluno de teologia do então professor Joseph Ratzinger. Na viagem, Bento XVI pôde ver um pouco da terra onde nasceu e viveu quando o avião sobrevoou cidades onde ele morou.