Título: FRANÇA RACIONA ÁGUA PARA ENFRENTAR A SECA
Autor: Vivian Oswald
Fonte: O Globo, 21/08/2005, O Mundo, p. 34

Agricultores são apontados como vilões por desperdiçarem o recurso nas irrigações

PARIS. Há dois anos, a morte de 14 mil idosos durante uma extraordinária onda de calor na França provocou um escândalo: idosos que moravam sozinhos morreram e alguns corpos apodreceram nos apartamentos. Não havia pessoal suficiente para recolhê-los e enterrá-los, pois o país estava paralisado, de férias. Desde então, os franceses se prepararam para o pior. Este ano, entretanto, o problema é outro: não há água.

Moradores de 67 cidades francesas estão sendo obrigados pela prefeitura a limitar o uso de água. A seca que assola o país só é comparável à de 1976. O ministério da Ecologia julgou preocupante a situação em 21 cidades de regiões como Midi-Pyrénées e Pays de la Loire.

¿A água está se tornando um recurso raro na França. É hora de acabar com a política de última hora de restrição de água¿, protestou, no jornal ¿Le Monde¿, a União Federal dos Consumidores, que acusa o governo de beneficiar agricultores com uma política de água arcaica.

Segundo a União, os agricultores são os grandes responsáveis pela atual penúria. Incentivados por generosos subsídios do governo, eles estão cultivando produtos muito intensivos, como milho. E durante o verão recorrem maciçamente à irrigação. Resultado: consomem 80% da água, desperdiçam-na e ainda pagam pouco por isso. Nas regiões mais afetadas pela seca, como Adour-Garonne, eles pagam menos pela irrigação ¿ 0,23 centavos de euro por metro cúbico ¿ do que em regiões pouco ou não afetadas, como Seine-Normandia e Rhin, que cobram entre 1,13 e 1,50 euros por metro cúbico irrigado.

Alguns criadores de gado dizem que estão tendo que recorrer às reservas de alimento do inverno para alimentar o gado, que está tomando água da bica porque os riachos estão secos. Eles querem que o governo construa reservas para que estoquem água durante o inverno ¿ uma solução que não agrada à União dos Consumidores, por não atacar o problema a longo prazo. Os únicos contentes são os viticultores, porque os vinhedos gostam de seca.

A seca na França também afetou o turismo. O grande lago de Serre-Ponçon, lugar tipicamente para turistas, na Provença, com campings, hotéis e colônias de férias, encolheu com a seca ¿ isto é, as águas baixaram ¿ e os turistas agora têm que andar sobre pedras e lama para entrar no lago.