Título: CLIMA CAÓTICO CASTIGA A EUROPA
Autor: Vivian Oswald
Fonte: O Globo, 21/08/2005, O Mundo, p. 34

Aquecimento global seria responsável por seca no Mediterrâneo e chuvas fortes nos Bálcãs

BRUXELAS. Estação do ano mais aguardada pelo europeus, o verão vem se tornando uma grande dor de cabeça para eles. A Europa está assustada com a onda de calor e a seca que tem assolado principalmente a região sul do continente. A Espanha vive a pior seca dos últimos 60 anos e trabalha com apenas 45% dos seus reservatórios de água. Como se não bastasse, este é o auge da alta estação, período em que o país costuma receber o maior número de turistas no ano. Em Portugal, o quadro não é muito diferente e a seca atinge 70% do país.

França, Itália e Grécia também estão na lista divulgada pela União Européia (UE) como os lugares que exigem maior atenção neste momento. Por toda parte, os governos nacionais deram início a grandes campanhas de racionamento de água. É o caso de 68 dos 96 departamentos da França, onde o déficit de chuvas tem atingido principalmente a costa Atlântica e o Vale do Ródano, que registram índices pluviométricos de 5 a 6 milímetros. Normalmente, deveriam estar entre 30 e 40 milímetros.

Seca faz aumentar o número de incêndios

A seca prolongada já atinge o setor agrícola europeu, que começa a refazer as suas contas. No sudoeste da França, por exemplo, 90% da água consumida pela população é usada na irrigação. Estima-se que para produzir um quilo de milho são necessários 500 litros de água.

A situação é tão grave que a falta de água, o calor, os ventos e o aumento das massas secas e de resíduos combustíveis nas florestas intensificaram o número de incêndios nas regiões mais afetadas. Segundo o estudo Sistema de Informações de Incêndios na Europa (Effis), divulgado esta semana pela UE, a análise sobre o risco de queimadas este ano mostra uma situação crítica.

Até o momento, 70 mil incêndios já destruíram 140 mil hectares e mataram 19 pessoas na Europa. ¿As perspectivas para o resto da estação das queimadas em 2005 são sombrias¿, diz o documento. Cerca de 80% dos incêndios registrados no continente ocorreram em Portugal e Espanha, que também respondem pelo equivalente a 76% da área devastada pelo fogo.

Estudo realizado pela WWF mostra que a temperatura subiu dois graus na Europa nos últimos 30 anos, causando períodos de seca cada vez mais longos e aumento dos riscos de incêndio.

¿ As temperaturas mais altas prolongam o verão, trazem dias ainda mais quentes e secas cada vez mais prolongadas. A falta de chuva, o calor e os fortes ventos aumentam os riscos de incêndio ¿ sustenta o diretor do programa para o Mediterrâneo da WWF, Paolo Lombardi.

A UE considera simplista atribuir o problema às mudanças climáticas e lembra que entre 80% e 85% dos incêndios registrados na região são provocados acidental ou propositalmente pelo homem. Mas, frisa Lombardi, as temperaturas elevadas criam condições ainda mais propícias para estes incidentes.

Segundo o relatório do Effis, os riscos de incêndio na região mediterrânea em junho deste ano já eram bem maiores do que os níveis registrados no ano passado e em 2003, quando o fogo devastou nada menos que 740 mil hectares, o equivalente a três vezes a superfície de Luxemburgo.

O professor da Divisão de Pesquisa sobre Florestas e Meio Ambiente da Universidade de Leuven, Martin Hermy, ainda acrescenta a urbanização mal planejada e a migração da população dos países mediterrâneos para as cidades ¿ deixando para trás áreas sem qualquer tipo de cuidado ou monitoramento ¿ como também responsáveis pelo grande número de incêndios. Para Hermy, não há solução a curto prazo.

¿ É preciso mudar a mentalidade e a atitude das pessoas. Aumentar os controles sobre as áreas de maior risco e reprimir ações deliberadas ¿ diz.

Segundo o diretor da WWF, além de adotar políticas para evitar mudanças climáticas ainda mais profundas na Europa no que diz respeito às emissões de gases na atmosfera, por exemplo, é preciso melhorar o planejamento urbano, reformular as políticas de reflorestamento nas regiões mediterrâneas ¿ que hoje usariam árvores menos resistentes do que as nativas ¿ e reforçar o controle sobre as áreas de risco.

Sejam quais forem as medidas a serem tomadas a curto prazo, estas terão que partir dos governos nacionais, uma vez que não existe uma política comum para o tema na UE.

UE só dispõe de 9 milhões de euros para ação em 25 países

O bloco até tem tentado orientar a ação dos países tendo por base estudos como Effis ¿ que inclui uma análise da situação climática européia e dos riscos de incêndio, além de um grande banco de dados sobre as regiões. No entanto, os recursos da UE para os projetos destinados a campanhas educativas e pesquisas não passam de 9 milhões de euros (cerca de R$26 milhões), a serem gastos nos 25 países que compõem a união no período de 2002 a 2006.

Se num extremo do sul da Europa falta água, no outro sobra: a região dos Balcãs tem sido castigada por fortes chuvas. As recentes inundações em Romênia e Bulgária provocaram graves estragos para a economia destes países. Na Bulgária, pelo menos 27 pessoas morreram devido às inundações, enquanto mais de dez mil casas foram destruídas.