Título: LUCRO MOVIDO A CÂMBIO E JUROS
Autor: Geralda Doca
Fonte: O Globo, 24/08/2005, Economia, p. 23

Resultado histórico dos bancos no 1º semestre veio de apostas no mercado futuro

Odólar baixo e os juros altos foram a principal razão dos gordos lucros dos bancos no primeiro semestre. Ao fazer uma análise mais detalhada dos resultados divulgados recentemente pelos principais bancos brasileiros ¿ Bradesco, Itaú, Unibanco e Banco do Brasil ¿ especialistas do mercado afirmam que não foram as operações de crédito e a redução dos gastos que elevaram as receitas recordes do setor. Mas sim os altos juros reais da economia e a valorização do real frente à moeda americana, que levaram as tesourarias dos bancos a apostarem no mercado futuro. São as chamadas operações com derivativos ¿ compra e venda na Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F).

¿ Os bancos apostaram certo na queda do dólar e na subida da taxa de juros no primeiro semestre deste ano ¿ afirma Carlos Coradi, da consultoria Engenheiros Financeiros & Consultores (EFC).

Segundo ele, isso ficou claro especialmente nos demonstrativos do Bradesco e do Unibanco. O caso mais expressivo é o do Bradesco, em que os ganhos com esse tipo de operação saltaram de R$126,8 milhões, no primeiro semestre de 2004, para R$1,57 bilhão no mesmo período deste ano ¿ um aumento de 1.137%.

Banco do Brasil é exceção à regra

Os ganhos do Bradesco com a concessão de empréstimos aumentaram apenas 6% ¿ quarto lugar na lista de influências sobre o resultado geral. Na primeira posição estão os ganhos com derivativos, seguidos por receitas financeiras (juros embutidos), com venda (seguros, previdência complementar e capitalização) e tarifas. O lucro líquido do banco teve um salto de 109,7%, de R$1,25 bilhão para R$2,62 bilhões.

No Unibanco, a aposta nos derivativos deu tão certo que a instituição se livrou dos números negativos auferidos com esse tipo de operação entre janeiro e junho do ano passado e se recuperou expressivamente, fechando o primeiro semestre de 2005 com lucro de R$506,12 milhões nas negociações na BM&F. Uma ajuda de fôlego ao lucro semestral global, que foi de R$854,22 milhões, ante os R$580,76 milhões registrados no ano passado.

Assim como o Bradesco, os ganhos do Unibanco decorrentes de operações de crédito no primeiro semestre cresceram pouco, 8,6%, ou R$334,32 milhões, segundo a compilação de dados da EFC.

¿ Ao contrário do que foi falado, não foram as receitas com operações de crédito as responsáveis pelo lucro histórico dos bancos ¿ destacou Coradi, excluindo apenas o Banco do Brasil (BB).

Para o presidente da BM&F, Manoel Felix Cintra Neto, os mercados derivativos são uma boa opção em momentos de incerteza, pois têm a função básica de proteger o patrimônio ¿ o chamado hedge.

Segundo Coradi, no mercado futuro existe sempre um ganhador e um perdedor. Quem apostou no início do ano que o dólar ia subir, por exemplo, perdeu dinheiro. Os que fizeram apostas de que o Copom iniciaria a redução da taxa básica (Selic) já em junho também perderam. Nesse mercado estão exportadores, importadores, tradings, tesourarias de bancos e empresas.

¿ O Bradesco pode ter ganho de um outro banco ¿ explica.

Já o Itaú, segundo maior banco privado do país, se beneficiou da forte valorização do real de outra forma: reduziu drasticamente as despesas com intermediação financeira. Só os gastos com captação no mercado tiveram uma queda de 69%. No primeiro semestre deste ano, o banco conseguiu no exterior R$1,84 bilhão, um aumento de 280% na comparação com o mesmo período de 2004, segundo o Instituto de Ensino e Pesquisa em Administração (Inepad).

¿ Com a valorização do real frente ao dólar, a despesa de R$533 milhões com intermediação virou receita, contribuindo assim para a expansão de 35% do resultado líquido do Itaú, que foi de R$2,47 bilhões ¿ explicou Edson Carminatti, analista do Inepad.

Além de captar a um custo menor e aplicar no mercado interno com juros mais elevados, disse Carminatti, com a desvalorização média do câmbio de 6,7% no primeiro semestre o Itaú precisou de menos reais para quitar a dívida contraída no exterior.

Maior instituição pública do país, o Banco do Brasil foi o único dos pesos pesados que fugiu do roteiro: a maior contribuição ao lucro semestral de R$1,97 bilhão veio do aumento das tarifas. A receita com os serviços cresceu 15,7%, para R$500,6 milhões. Em seguida pesaram os ganhos com redução de despesas administrativas e as receitas com crédito, que subiram 8,1%.