Título: PASTOR PEDE A CABEÇA DE CHÁVEZ
Autor: José Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 24/08/2005, O Mundo, p. 29

Líder da direita cristã dos EUA prega que agentes secretos assassinem presidente da Venezuela

Um dos principais porta-vozes do movimento conservador cristão dos Estados Unidos provocou uma crise de caráter internacional ao sugerir que a Casa Branca deveria enviar agentes para assassinar o presidente da Venezuela, Hugo Chávez. Ex-pré-candidato do Partido Republicano à Presidência, o pastor evangélico Pat Robertson provocou revolta na Venezuela e constrangimento para o governo americano.

¿ Não precisamos gastar mais US$200 bilhões numa guerra para nos livrarmos de um ditador tirano. É muito mais fácil organizar operações secretas para fazer o trabalho e acabar com isso. Seria muito mais barato do que iniciar uma guerra. E acho que nenhum embarque de petróleo (da Venezuela) para nós seria paralisado por causa disso ¿ disse Robertson no programa ¿Clube 700¿, com audiência estimada em um milhão de pessoas, na Rede de Emissoras Cristãs, fundada por ele como uma espécie de púlpito eletrônico da extrema-direita.

A desastrosa intromissão de Robertson na política externa americana se deu justamente num momento em que o governo americano vem fustigando Chávez publicamente, acusando-o de estar tomando iniciativas que põem em risco os governos do Equador e da Bolívia. Matt Reynolds, secretário de Estado assistente para Assuntos Legislativos, escreveu um informe dizendo que os EUA haviam encontrado ¿provas cada vez mais claras de que a Venezuela está usando ativamente a sua riqueza do petróleo para desestabilizar os seus vizinhos democráticos nas Américas, financiando grupos antidemocráticos na Bolívia, no Equador e nas imediações¿.

No entanto, ele não descreveu as supostas provas. Diante da pressão da imprensa, Tom Casey, outro porta-voz do Departamento de Estado, simplesmente disse que não se sentia ¿livre para discutir assuntos de espionagem ou outras informações sigilosas¿, e que bastava olhar as ações públicas de Chávez para se ter uma idéias das preocupações americanas.

Robertson, 75 anos, é um dos mais poderosos porta-vozes do movimento conservador americano. Influente, consegue audiências a sós com o presidente George W. Bush quando quer. Por isso, o porta-voz do Departamento de Estado, Sean McCormack, tentou apagar o incêndio político provocado pelas declarações do pastor.

¿ Pat Robertson é um cidadão privado. As suas opiniões não representam a política dos EUA. Não compartilhamos delas. Seus comentários são inadequados. Quaisquer alegações de que estamos planejando adotar uma ação hostil contra o governo da Venezuela é completamente sem fundamento e irreal ¿ disse ele.

Rumsfeld diz que assassinato é ilegal

Embora repetisse isso muitas vezes na entrevista coletiva, ele vacilou ao ser perguntado se os EUA se sentiam obrigados a cumprir um tratado internacional de 1971 que proíbe o assassinato de líderes estrangeiros:

¿ Eu não tenho essa convenção aqui à minha frente ¿ disse ele.

O secretário de Defesa dos EUA, Donald Rumsfeld, afirmou que a ação sugerida é ilegal:

¿ Claro que isso é contra a lei. O Pentágono não faz esse tipo de coisa.

As declarações de Robertson causaram um grande mal-estar nos bastidores do governo, que desde abril vem elaborando um plano menos truculento para isolar Chávez. A sugestão de assassiná-lo provocou uma irritação bem maior do que a que se viu em outubro de 2003 quando, insatisfeito com o fato de o Departamento de Estado estar criticando ações do Pentágono no Iraque, Robertson disse que aquele ministério ¿deveria ser destruído com uma bomba nuclear¿.

Uma porta-voz de Robertson disse que ele não daria nenhuma entrevista ontem e tampouco tinha preparado qualquer comunicado detalhando a proposta. A grande maioria dos líderes religiosos e políticos conservadores manteve-se em silêncio. Mas o reverendo Barry Lynn, diretor da entidade Americanos Unidos pela Separação da Igreja e Estado, reagiu:

¿ É absolutamente de arrepiar ouvir um líder religioso clamar pelo assassinato de um líder político, mesmo que discorde dele.

David Brock, presidente do Media Matters, entidade de esquerda que monitora o trabalho da mídia, emendou:

¿ Ele deveria ser desacreditado como porta-voz da direita religiosa.

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