Título: CPIs em crise
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 27/08/2005, O Globo, p. 2

As CPIs entraram num labirinto e as pessoas cobram resultados. Querem saber toda a verdade sobre o esquema financeiro montado pelo PT para sustentar seu projeto político, querem saber de onde veio o dinheiro do valerioduto e quem se beneficiou dele. Querem ver os culpados punidos. A iniciativa do presidente do Senado, Renan Calheiros, de reuni-las para estabelecer fronteiras e evitar a competição, parte do óbvio: a falta de resultados alimenta a suspeita de que estejam todos cozinhando a crise e preparando a pizza.

Esta desconfiança manifesta da sociedade não é ruim só para o governo, o PT e seus aliados, que estão no olho das investigações. Alcança por tabela todos os partidos e forças políticas, pois acordão não acontece se um não quer. Não há tal acordo em pauta. Não interessa à oposição, a quem o PT ofereceu com sua lambança a oportunidade de voltar ao poder para ficar; e nem mesmo ao PT, que só renascerá a partir da renovação e da depuração propiciadas pela verdade que distinguirá uns e outros.

As CPIs enfrentam problemas diversos, a começar pela fogueira de vaidades que nunca ardeu como agora, na primeira crise da era das comunicações em tempo real. O mal já atacava a CPI dos Correios quando reinava sozinha. Agravou-se com a instalação das outras duas, por insistência da oposição, que já se arrepende. E como já não se obedece ao ¿fato determinado¿ como antigamente, as três batem cabeça, investigam tudo e se atropelam, movidas pela disputa. A do Mensalão ouviu os dirigentes dos fundos Petros e Funcef em sessão fechada na quarta-feira. Mas vai ouvi-los de novo, em sessão aberta, transmitida ao vivo, na próxima quarta. E a vizinha CPI dos Correios, imediatamente, respondeu com a quebra do sigilo das aplicações de 11 fundos, em busca do dinheiro público que ainda não foi encontrado no valerioduto. A dupla convocação de Toninho da Barcelona e Daniel Dantas é outro exemplo.

O que Renan deseja é um acordo de procedimentos entre elas, e se possível, a instituição de um conselho das CPIs, composto pelos três presidentes e os três relatores. Eles se reuniriam toda segunda-feira para traçar planos não coincidentes de trabalho. Seria simples se não fosse a síndrome da luz televisiva, agravada pela disputa política já delineada para o ano que vem, inclusive entre os dois maiores partidos da oposição, PFL e PSDB. Até dentro de cada partido há problemas. O líder do PFL, Agripino Maia, reunirá sua tropa nas três CPIs para acertar ponteiros e condutas.

Entre as três, para o PT e o governo, a de mais difícil administração é a dos Bingos, a caçula da qual se esperava pouco. Na dos Correios, que se sente a mãe da crise, mal ou bem os governistas conseguem equilibrar suas forças com a oposição. A do Mensalão andou se afastando de seu objeto específico, apontar os deputados que, beneficiados pelo valerioduto, mereçam a cassação. Ao buscar também as fontes do valerioduto, estaria reagindo à arrogância da vizinha, que dificulta até o acesso a documentos que deveriam ser de uso comum. Mas seu presidente Amir Lando, e seu relator Abi-Ackel, são homens de diálogo e negociação, e menos envolvidos com a luta política.

Já a CPI dos Bingos está se tornando um buraco negro para o governo. Sua composição reflete a correlação de forças no Senado, altamente desfavorável ao governo. O placar ali é de 15 a 6. O que alivia a situação é o bom diálogo do senador Tião Viana com a oposição. Ali Rogério Buratti complicou a vida do ministro Palocci. O mercado fez ouvidos moucos mas o ministro continua na mira. São vinculados a esta CPI, que está investigando até um morto, Ralf Barquete, personagens como Buratti, Waldomiro e Toninho da Barcelona, que ainda não falaram tudo.

As CPIs já feriram fundo o PT e o governo mas a sociedade pede mais que danos políticos quando cobra toda a verdade através de resultados que estão demorando a aparecer.