Título: PROCURADOR-GERAL MANTÉM INVESTIGAÇÃO A SETE CHAVES
Autor: Carolina Brígido/Rodrigo Rangel
Fonte: O Globo, 28/08/2005, O País, p. 14

Antonio Fernando de Souza se cercou de um pequeno grupo de sua confiança para apurar denúncias de corrupção

BRASÍLIA. Empossado em meio à crise, o novo procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, tem se pautado pela discrição. Em suas poucas declarações públicas, ele faz questão de frisar que até agora não há algo que comprometa o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no inquérito que apura o mensalão. No Ministério Público Federal, Antonio Fernando divide opiniões por guardar a investigação a sete chaves.

No aspecto técnico, o procurador-geral é elogiado por aliados e opositores. A polêmica está na postura política que vem adotando desde que assumiu o cargo. Antonio Fernando fala pouco e é acusado por seus críticos de ser fechado demais, autoritário e centralizador. Para investigar os escândalos, cercou-se de um pequeno grupo de procuradores de sua confiança. Ali, a ordem é também não falar. E muito menos vazar informação para a imprensa.

Fonteles foi o principal articulador da nomeação

A oposição ao grupo do qual o procurador-geral faz parte não é de hoje. Antonio Fernando é ligado a seu antecessor, Claudio Fonteles. Foi Fonteles, aliás, o principal articulador da decisão que levou à sua nomeação. Ao ouvir do presidente o pedido para permanecer no cargo por mais um mandato, Fonteles reafirmou que não queria ser reconduzido, mas observou que ficaria satisfeito se o escolhido fosse Antonio Fernando. E assim foi feito.

O marco da resistência ao grupo capitaneado por Antonio Fernando e Fonteles é a polêmica que pôs o subprocurador José Roberto Santoro na berlinda pelo modo como obteve a fita que detonou o escândalo Waldomiro Diniz. Desde então, a instituição está rachada.

Nesse embate, a ala do procurador-geral estaria perdendo. Pelo menos no Conselho Superior do Ministério Público, órgão máximo da instituição, Antonio Fernando não tem maioria. Isso ficou evidente há pouco mais de um mês, quando o conselho decidiu arquivar o procedimento instaurado para averiguar se Santoro extrapolou suas funções ao receber o empresário de jogos Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, durante a madrugada para convencê-lo a entregar a fita do caso Waldomiro. Antonio Fernando, seguindo postura adotada antes por Fonteles, defendia punição para Santoro. Acabou derrotado pela outra ala. Foram sete votos contra três.

Entre as críticas, pesam contra o procurador-geral declarações recentes pró-governo. Além de dizer que não há motivos para investigar o presidente, na semana passada Antonio Fernando fez coro ao discurso governista para criticar a atuação dos promotores de São Paulo que revelaram as acusações de Rogério Buratti ao ministro da Fazenda, Antonio Palocci.

Os procuradores que defendem Antonio Fernando o fazem com base nos mesmos motivos que provocam as críticas. Para essa ala do Ministério Público Federal, o procurador-geral tem agido corretamente, com discrição e responsabilidade, e tal postura deve nortear a instituição. Para colegas mais próximos, ele tem conduzido o inquérito do mensalão de maneira serena e tranqüila, sem se preocupar com o estrago político que o resultado da investigação poderá provocar. O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, Nicolao Dino, elogia o estilo de Antonio Fernando. Para ele, esse tipo de atitude pode dar mais credibilidade ao Ministério Público.

- Ele tem se posicionado muito bem. É um assunto complexo, que deve ser tratado com seriedade. Isso vai tirar das pessoas a idéia de que o Ministério Público fica fazendo acusações infundadas pela imprensa - diz.

CORPO A CORPO - ANTONIO FERNANDO DE SOUZA

'O MP não fará juízo político'

O procurador-geral da República rejeita o rótulo de governista e afirma que comanda as investigações sobre corrupção com "a observância estrita dos deveres" que a Constituição lhe atribui.

Como o senhor avalia seu modo de trabalho?

ANTONIO FERNANDO DE SOUZA: Com seriedade, independência e observância estrita dos deveres que a Constituição me atribui.

Há setores no Ministério Público que lhe fazem duras críticas.

ANTONIO FERNANDO: Admito que alguém possa fazer crítica, mas eu não percebi. Ninguém me trouxe essa crítica pessoalmente.

Acusam-no de ter uma postura governista. Por exemplo, por ter participado na quarta-feira de reunião no Planalto para tratar da crise.

ANTONIO FERNANDO: O convite se baseou na informação de que seria uma reunião de chefes de instituições, sem conotação política. Na reunião deixei muito claro isso, que não assumiria compromisso algum.

O senhor fez coro ao discurso do governo ao criticar a atuação dos promotores de São Paulo.

ANTONIO FERNANDO: A nota foi no sentido de que o Ministério Público Federal e o procurador-geral pautam a sua atuação investigatória nas regras da instituição e da responsabilidade. Tanto que o doleiro Toninho da Barcelona estava sendo ouvido em Curitiba e a imprensa sequer sabia do lugar em que ele estava sendo ouvido. Essa é a minha conduta.

Diante do que o senhor já tem em mãos, é possível apontar o envolvimento do presidente da República?

ANTONIO FERNANDO: Até o momento, com os elementos que temos, na avaliação sobre fatos penais e civis, não. Mas o inquérito ainda está em fase inicial. Há muitas diligências que precisam ser efetuadas.

O que o senhor pode concluir com base nas investigações já feitas?

ANTONIO FERNANDO: Ao Ministério Público interessa a obtenção de prova consistente. O Ministério Público não vai fazer qualquer juízo político ao fim das investigações. Vai fazer um juízo de responsabilização penal e civil das pessoas. A avaliação política é reservada ao Congresso. (Rodrigo Rangel e Carolina Brígido).

Legenda da foto: ANTONIO FERNANDO: postura política do procurador-geral provoca polêmica no Ministério Público Federal