Título: RISCO DE VIRAR UMA ESPÉCIE DE PERONISMO
Autor: Flávio Freire
Fonte: O Globo, 30/08/2005, O País, p. 5

Chico de Oliveira alerta para perspectiva sombria do PT

Um dos mais afiados críticos do governo Lula, o sociólogo Francisco de Oliveira diz que o PT sobreviverá se a militância resolver rebelar-se e "reverter esse quadro".

- Mas isso é muito difícil - disse ele, ontem à noite, no ciclo de palestras "O silêncio dos intelectuais", organizado por Adauto Novaes.

As outras perspectivas, explicou, são ele se transformar numa espécie de PMDB ou, no quadro mais sombrio, num peronismo.

- Desaparecida a liderança maior que aglutina, vão sobrar os caciques. O PT pode se transformar numa federação de gangues que disputam o espólio - disse ele, que é fundador do partido, do qual se desligou em 2003.

Chico de Oliveira, como é conhecido, alertou que não queria falar muito do governo Lula, mas, provocado por perguntas da platéia, acabou falando da crise.

- A esquerda brasileira não subsistirá se o PT cair pelas tabelas. Mas o PT é a mais poderosa máquina eleitoral e partidária da América Latina e, provavelmente, do mundo. Não aposto na sua dissolução.

Daí, disse, a importância de apontar erros.

- Há um indeclinável dever dos intelectuais de fazer a crítica. Não vou ficar calado.

E não ficou:

- Lula refugiou-se no conservadorismo porque não tem programa algum. Para ele, política é como uma negociação sindical, que tem dois lados. Ou um dos dois perde ou se faz uma conciliação. É uma concepção pobre.

Ele acredita que o governo também se refugiou nos fundos de pensão:

- Para ter retaguarda financeira capaz de sustentar taxa de juros e todas as conseqüências de uma política conservadora, de financeirização total da economia.

Oliveira disse que a interlocução entre intelectual e política na formação brasileira é "visceral" e citou vários exemplos, como o de Celso Furtado. Mas ressalvou:

- Furtado deve ser o ponto de partida, mas não o ponto de chegada.

O sociólogo citou a falta de uma teoria crítica alternativa:

- Agora quem é nosso herói? Voltou a ser JK. Nós da academia temos a obrigação de ajudar a forjar uma nova interpretação do Brasil que abra espaço para a nossa plena realização de nação nesse mundo globalizado.